Mesmo tarde, Lula tem obrigação de se retratar

Mesmo tarde, Lula tem obrigação de se retratar

Lula podia ter criticado o primeiro-ministro israelense e a coalizão religiosa de extrema-direita que o mantém no poder sem, para tanto, ofender e ferir o povo judeu e, para além, toda a humanidade. Afinal, Bibi e seu governo são mais que criticáveis, pelo pouco apego à democracia, pela corrupção, por ter negligenciado a segurança do país, por privilegiar os interesses pessoais, pelo extremismo e enfim, mais importante, pelos crimes de guerra que vem cometendo. Mas não, o presidente brasileiro preferiu, de maneira consciente ou não, se atacar ao símbolo máximo do mal absoluto, o Holocausto. Acabou, como só podia ser, ferindo gravemente a memória universal. Machucou cruelmente os judeus, claro, porém não apenas, ultrajou todas as vítimas do nazismo, seus sobreviventes e herdeiros, ou seja você, eu, muitos de nós. Netanyahu foi o menos atingido pelas palavras ferinas; os judeus do mundo inteiro, os principais ofendidos. Lula não deve desculpas ao primeiro-ministro de Israel, mas sim a nós.
Talvez ele não tenha se dado conta da crueldade de suas palavras, imaginando que tudo não passava de uma “simples” crítica à morte deplorável de milhares de mulheres e crianças, em Gaza. Errou, e feio. Propositadamente ou não, atiçou o fantasma do antissemitismo, imediatamente abraçado pela esquerda radical, que não hesita em responsabilizar os judeus pelos horrores da guerra. Para chamar a atenção sobre a tragédia, Lula comparou o incomparável e para deixar bem claro o seu alvo, apelou para Hitler. Recorreu, como lembrou a jornalista Lygia Maria na Folha de S. Paulo, para a lei de Godwin, que postula: ” À medida que uma discussão online se alonga, a probabilidade de surgir uma comparação envolvendo Adolf Hitler ou os nazistas tende a 100%”.
“Findados os argumentos senasatos para provar determinado ponto, acaba-se descambando em Hitler ou no Holocausto…Lula foi parar na lei de Godwin sem escalas. Poderia ter se saído bem com argumentos legítimos, como comparar aos crimes de guerra perpetrados pela Rússia na Ucrânia…Mas nesse caso não agradaria à militância de esquerda.”
Único porém, o episódio Lula se deu no mundo real, não no virtual.
Ao invés de tentar trazer o presidente brasileiro de volta à razão, seu entorno aplaudiu, conclamando que não havia nenhum motivo a pedidos de retratação, de desculpas e nem sequer de explicação. Celso Amorim, Gleisi Hofman, Janja, entre outros, vieram a público para defender o “mito”. Sim, porque Luis Inácio Lula da Silva virou mito, e, como tal, tem sempre razão, é infalível.
Dá pra’ entender, pois a esquerda brasileira hoje depende dele para sobreviver. O resultado da eleição presidencial mostrou claramente que ele era o único capaz de derrotar o nazifascista Bolsonaro, graças aos votos dos conservadores, que se a democracia não estivesse em risco jamais teriam apertado na tecla 13.
Como escreveu o filósofo Vladimir Safatle (de esquerda) em seu novo livro “Alfabeto das Colisões”, a esquerda morreu, a extrema-direita é a única força política real no país. A vitória de Lula foi só um respiro, enquanto a extrema-direita continua forte, e mascara a dificuldade de propor soluções para os desafios atuais.
Pobres daqueles que ousaram reclamar uma retratação. Lula nem sequer respondeu, limitando-se a dizer que os críticos não leram a sua entrevista na Etiópia. Ou seja, que a alusão ao holocausto foi tirada do contexto (argumento sempre presente na boca de políticos quando pressionados). Paralelamente, o dono da política externa brasileira, Celso Amorim, autor do prefácio do livro “Engajando o mundo: a construção da política externa do Hamas”, declarou, em alto e bom som, que aqueles que querem um pedido de desculpas podem esperar sentados: – O improviso de Lula em Adis Abeba, disse Amorim, não foi um lapso nem merece reparação, pois representa a política externa do país.
Em outras palavras, não foi um deslize ou algo não ou mal pensado. Ao contrário, trata-se da posição oficial do Brasil.
Na apresentação da edição brasileira do livro, lançada pela editora Memo em 2023, assinada pelo diplomata, lê-se : “O Hamas pode desempenhar um papel central na restauração dos direitos palestinos.” Estamos longe portanto da afirmação de que o Hamas é um grupo terrorista. Ao contrário, o principal conselheiro de Lula exalta o Hamas.
É verdade que a maneira como o governo israelense tratou o assunto não foi adequada. Ao chamar o embaixador brasileiro para explicações, devia ter seguido as regras diplomáticas, que exigem discreção, e não ter dado um show humilhante. No entanto, uma coisa não justifica a outra.
A postura de Amorim talvez não seja tão absurda como parece à primeira vista. Tem sua lógica. Explico: É sabido que os 8,5 milhões de quilômetros quadrados do país não são suficientes para Lula, que sonha em se tornar uma liderança global, uma espécie de consciência universal, como foi Nelson Mandela. Muito se falou, no Brasil, da possibilidade de Lula vir a ser secretário-geral da ONU, enquanto outros apresentaram seu nome para o Nobel da Paz.
Seus dois primeiros mandatos foram marcados internacionalmente pela pela criação dos BRICS, pela onipresença do Brasil na América Latina e pela necessária reforma do Conselho de Segurança. No mesmo movimento, o terceiro começou com a inclusão de outros cinco países no grupo, dentre os quais o Irã.
O presidente sabe que suas chances são aquém de mínimas, mas isso não significa que ele desistiu do reconhecimento global. Só mudou a estratégia. Megalomania é uma das características da personalidade de todos os políticos, ainda mais daqueles que querem alcançar o cargo máximo da Nação. Lula não é exceção, busca os holofotes, dentro e fora do Brasil.
Em importância geopolítica, o mandatário brasileiro não tem como pesar tanto quanto seus pares da China, Índia ou Rússia, resta-lhe portanto por um lado se juntar a estes, de outro – e simultaneamente – cimentar o Sul Global, com vistas a formar uma grande coalizão anti-ocidental, que representaria no médio prazo os mesmos 40% do PIB mundial do G7 . O papel de Lula seria o de atrair os países do sul para a constituição deste polo, que pretende mudar as relações internacionais e, assim sendo, o mundo. As viagens de fevereiro de 2024 ao Egito, aproximando-se da Liga Árabe, e à Adis Abeba, para discursar na abertura da conferência da União Africana, tiveram este objetivo. O Brasil tem uma situação privilegiada, podendo servir de ponte entre as grandes potências não ocidentais e o Sul Global.
Neste contexto internacional, a “defesa da democracia”, tão presente na campanha de Lula para vencer a extrema-direita bolsonarista, tem valor zero. A coalizão está aberta a todos os países, que respeitem ou não os direitos humanos, o Estado de Direito, à única condição que se oponham ao ocidente, representado pelos Estados Unidos, Europa e, no Oriente Médio, Israel. É uma estratégia que se resume em uma frase: – Os inimigos dos meus inimigos são meus amigos.
Lula, Xi Jinping, Putin, Narandra Modi, estão juntos na perspectiva do Novo Mundo. No caso do brasileiro, os interesses geopolíticos explicariam os ataques nojentos aos judeus, da mesma forma como ficou claro porque Lula se negou a comentar a responsabilidade de Putin no assassinato de Alexei Navalny e os crimes cometidos pelos russos na Ucrânia, ou ainda se opôs a criticar os ataques ditatoriais de Nicolas Maduro.
Para fechar este texto, cito novamente Lygia Maria:
“Ao cair na lei de Godwin, Lula incita polarização política (vide o número de bandeiras de Israel na manifestação bolsonarista do dia 25/2), antissemitismo e, de lambuja, ainda envergonha o Brasil.”
Por tudo isso, em nome do respeito pela memória, o presidente brasileiro tem a obrigação de se retratar, mesmo que seja tarde demais.

Lula ofendeu os judeus, os ciganos, os gays, os deficientes…

Lula ofendeu os judeus, os ciganos, os gays, os deficientes…

Há pouco mais de um ano, nos braços da minha mulher, em plena madrugada, eu comemorava a vitória de Lula presidente. Como havia dito dias antes Gilberto Gil num show na Île de Ré,” Lula para acabar com o pesadelo”. Naquele noite chorei copiosamente, de felicidade, talvez mais ainda de alívio. Tinha consagrado os últimos dois anos a fazer campanha pela eleição de Lula, criando o Coletivo Judias e Judeus Sionistas de Esquerda e o Comitê de judeus com Lula/Alckmin, atuando em plataformas de esquerda. Derrotar Bolsonaro se transformou em obsessão. Trabalhamos duro na relativamente fácil tarefa de fortalecer a convicção dos progressistas e convencer os indecisos, e na muito mais difícil de trazer para o nosso campo os conservadores avessos a Lula, muitos dos quais denunciavam a ambiguidade com relação aos judeus e a Israel. Lembrávamos então, incansavelmente, que Lula foi o primeiro presidente brasileiro a visitar Israel e sempre defendeu a tese de Dois Estados.
Vencemos!
Pessoalmente, me orgulho de ter conseguido virar o voto de ao menos cinquenta eleitores judeus; uma gota d’água que contou na apertadíssima vitória.
Hoje, me sinto desiludido, envergonhado, ofendido. Peço desculpas a todos aqueles com quem argumentei que Lula tinha provado, em dois mandatos, ser um chefe de Estado equilibrado, moderado. Eu, como todos os judeus que votaram Lula, amplamente majoritários, queiram ou não queiram nossos detratores, estamos todos ofendidos, envergonhados, desiludidos com Lula, que ousou o inimaginável, ao declarar, em Adis Abeba:
“Sabe, o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus.”
Entendo que Lula queira passar por um “gauchista” para satisfazer seu eleitorado de esquerda e por um humanista diante daqueles que denunciam os horrores da guerra, no Brasil como no resto do mundo, já que nunca desistiu de ser visto como um líder mundial. Só que agora caiu no discurso fácil do “os judeus estão agindo como os seus algozes.”
Lula realmente ultrapassou a linha vermelha. Comparar o que acontece em Gaza com o Holocausto é revisionismo ignóbil !
Lula não ofendeu “apenas” os 17 milhões de judeus, ofendeu todos os perseguidos, assassinados e gazados nos campos nazistas – ciganos, deficientes, comunistas, homossexuais, testemunhas de Jeová, em nome da raça pura e do pensamento único. Em outras palavras, o presidente do Brasil ofendeu todas as vítimas, as minorias, ofendeu a Humanidade.
Recebeu em contrapartida os elogios merecidos do Hamas. Até então, nenhuma liderança árabe tinha ido tão longe quanto o brasileiro. Que presente ao grupo terrorista!
Domingo, na Etiópia, Lula enterrou seu histórico humanista.
Pode se criticar a ação militar de Israel e os crimes de guerra cometidos, deve se criticar o governo Netanyahu, de extrema-direita, e clamar por um cessar-fogo, mas falar em genocídio e holocausto é uma mentira de quem não quer a paz, de quem, por um motivo ou outro qualquer, quer importar o conflito para tirar benefícios.
A cada fala (sem comparação com esta, que ultrapassou todos os limites da decência) , Lula libera a palavra e os atos dos profissionais da discriminação.
Ao invés de colocar lenha na fogueira do antissemitismo, o presidente deveria se lembrar que como responsável pelo clima reinante no Brasil precisa agir com responsabilidade e não como um mero militante sem papas na língua.

Israel comete limpeza étnica e genocídio?

Israel comete limpeza étnica e genocídio?

Dentre as múltiplas acusações que pesam sobre o “Estado colonial sionista de Israel” está a de praticar limpeza étnica e genocídio, em Gaza como nos territórios ocupados da Cisjordânia. As vítimas seriam, é claro, os palestinos. Será que as denúncias procedem?
A história, na versão palestina, começa com a grande catástrofe, a Nakba, consequência da criação de Israel, em 1948, seguida da primeira guerra. 700 mil palestinos teriam então sido obrigados a deixar suas casas, suas terras, e se refugiar nos países árabes vizinhos. Em maio de 1948, forças do Egito, Síria, Jordânia, Iraque , Arábia Saudita e Líbano invadiram Israel, levando à primeira de uma série de guerras . No ano seguinte foi alcançado um armistício e a Cisjordânia foi separada de Israel para se tornar território jordaniano e Gaza foi designada como território egípcio.
Vejamos sob um outro ângulo, dos nossos irmãos sefarditas: em 1948, 265 mil judeus viviam no Marrocos, em 2023 eram 2 mil; na Argélia, de 140 mil só restaram 50; na Tunísia viviam 150 mil judeus, contra 50 no ano passado. E assim por diante: na Líbia e na Síria eram por volta de 40 mil, hoje, zero; no Egito 75 mil, hoje 40; no Iêmen, 55 mil, hoje 50; no Iraque de 150 mil só restaram 7; e no Líbano (então Suíça do Oriente Médio) dos 20 mil ficaram 100.
Ou seja, a população judaica nos países árabes diminuiu 99,83%.
Em contrapartida, em Israel, viviam 156 mil árabes em 1948, contra 2.178.000 em 2023. Conclusão: neste período de 75 anos a população árabe em Israel cresceu 1.296,15%.
Em Gaza, a população passou de 34.250 a 2.106.745, com uma taxa de natalidade de 2,8, após ter chegado a mais de 4. Obviamente, hoje nenhum judeu vive na Faixa de Gaza.
Interessante também notar que dos mais de 900 mil judeus que foram expulsos dos países árabes, nenhum teria se tornado refugiado sob cuidados da ACNUR, a agência da ONU para os refugiados, enquanto a UNRWA, agência da ONU para os refugiados palestinos, criada em 1949, conta com mais de 30 mil funcionários, encarregados de dar assistência aos palestinos, que continuam vivendo em condições precaríssimas, em campos situados nos países árabes vizinhos. Em muitos deles, não têm o direito de trabalhar, de ter uma habitação digna, sem água nem saneamento básico, e sequer direito de se casar com alguém de fora do campo. Muito embora eles sejam filhos, netos e até bisnetos de refugiados.
Hoje, o Estado de Israel e os judeus da diáspora são acusados de terem cuidado dos seus. Talvez, na cabeça dos antissemitas, isto signifique limpeza étnica ou, quiçá, genocídio

Lula deu um tiro no pé

Lula deu um tiro no pé

No último dia 10, o presidente Lula apoiou oficialmente a denúncia por genocídio contra Israel, de autoria da África do Sul, na Corte Internacional de Haia. 14 países seguiram o mesmo caminho. Desse total, 13 não respeitam os direitos humanos nem podem ser chamados de democráticos. Mas aparentemente este tipo de reflexão não é levado em consideração; nas relações internacionais o que conta são os interesses de cada um, tanto os nacionais quanto os pessoais. É o caso do Brasil de Lula, que não está nem um pingo preocupado com a verdade e menos ainda com o aumento do antissemitismo, que cresceu “apenas” 1.000% no país, desde o início da guerra entre Israel e o Hamas.
O governo não tem hesitado em jogar no lixo o tradicional equilíbrio da sua política externa, a moderação que tantos elogios e respeito trouxeram à diplomacia do Itamarati nos tempos pré-Bolsonaro.
Talvez sem nem sequer se dar conta, Lula, ao aderir à denúncia, abriu a porteira para que a sua boiada passasse aos berros, distilando antissemitismo. Foi o aval que faltava.
Representando o Brasil na ONU, Celso Amorim foi o primeiro, ao acusar Israel de genocídio muito antes de Pretória; seguiram a presidenta do PT, Gleisi Hofman, Janja, a primeira-dama, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, o ex-presidente do PT, José Genoino.
Gleisi defendeu quem chamou os judeus de ratazanas, numa alusão às perseguições sofridas na Idade Média, quando foram acusados de espalhar a peste, e ainda acusou a Conib, entidade representativa dos judeus brasileiros, de traição por agir “em nome de Israel”. Uma acusação que lembra a condenação do capitão Dreyfus pela Justiça francesa, pelo simples crime de ser judeu.
Quanto a Genoino, teve a ousadia de propor o boicote de empresas de judeus, fato que em 1938 precedeu a tristemente célebre Noite dos Cristais, em que sinagogas e negócios de judeus foram destruídos.
O ministro Mauro Vieira publicou uma nota na qual explica a posição brasileira, porém, provavelmente envergonhado, evita afirmar que Israel comete genocídio.
Mesmo assim, alguns judeus de esquerda, que como eu passaram dias e noites a fazer campanha pró Lula (e que militam pela solução de 2 Estados), ainda acreditam na boa fé do presidente, que talvez esteja sendo mal orientado e que precisaria portanto ouvir o que essa parcela do seu eleitorado tem a dizer.
Quanto à primeira-dama, lançou um manifesto em defesa das mulheres palestinas, sem nem uma palavra sequer sobre o pogrom sexual sofrido pelas israelenses no dia 7 de outubro: mulheres estupradas, esquartejadas, mutiladas, que chegaram a ter seus fetos arrancados de dentro do ventre materno e assistiram a monstruosidade de ver seus filhos assados vivos num forno. Nada disso parece tê-la sensibilizado. Janja só viu violência de um lado. Mesmo assim o presidente, apaixonado, declarou: – Ela é o meu farol.
A verdade é que a política externa derrapou e que Lula optou por acariciar a pseudo esquerda pró Hamas, que talvez seja o grosso de seu eleitorado, sobretudo no sul do país.
Tudo isso provoca antissemitismo, é lenha na fogueira do ódio. A memória da Shoah foi banalizada.
Lula parece não estar nem aí com o antissemitismo que se espalha pelo país, como se não lhe dissesse respeito. Se o Brasil optou pela adesão à denúncia sul-africana parece ter sido por duas razões: a primeira, eleitoral, óbvia; a segunda, uma jogada de política externa, uma espécie de ação de força do Sul Global, tão caro ao presidente. Que a denúncia tenha sido feita por Pretória, país membro dos BRICS, foi uma dádiva para o fortalecimento do grupo que teve o Brasil na linha de frente. O Sul Global, mais a Turquia, o Irã, a Arábia Saudita, enfim os países que querem desempenhar um papel na futura ordem mundial, como é o caso do Brasil – e de Lula, só podiam apoiar a denúncia de genocídio, que atinge os Estados Unidos e seu amigo, o “Israel colonial”.
A gesticulação faz parte da guerra contra o Ocidente. O presidente brasileiro escolheu o seu campo e espera tirar benefício, inclusive pessoal, de sua opção. Lula certamente ainda sonha em vir a ser uma liderança mundial, por isso seu caminho será pautado pela Rússia, China, Índia, pelo Sul Global, não por Washington nem por Bruxelas. Nessa nova ordem mundial pouco importa a ideologia, os valores, a democracia, os direitos humanos, o estado de direito. Vale tudo e não são mil por cento a mais de atos antissemitas, uns pogroms aqui outros lá, a invasão de um país (a Ucrânia), que vão atrapalhar a construção em andamento desse novo mundo em que nós, judeus, corremos o risco de ser, uma vez mais, bodes expiatórios.
A existência de Israel está ameaçada, por razoes externas e internas. E a nossa existência como judeus da diáspora (incluindo os brasileiros), também.
Em contrapartida, a pseudo esquerda e a extrema-direita exultam.
A narrativa antissemita

A narrativa antissemita

Na narrativa dos antissemitas, os primeiros habitantes da Palestina não têm o direito de ali estar. Para eles, a história da região só começa com a Nakba, a catástrofe do êxodo de 600 mil palestinos, em 1948. Uma história contada por um único lado, já que na época 850 mil judeus foram expulsos dos países árabes onde moravam. O que aconteceu com estas centenas de milhares de judeus parece não ter a menor importância. Esta foi a forma encontrada pelos antissemitas para “explicar” que Israel é fruto de uma ideologia colonial e racista. É de uma má fé sem limites! Os judeus são o povo mais discriminado dos últimos 3 mil anos.
O discurso da esquerda radical não difere daquele que condenou o capitão Dreyfus por alta traição, em 1894, pelo fato de ser judeu. É o prosseguimento lógico do antissemitismo do século XIX.
Em nome do combate ao Ocidente, alia-se com os terroristas do Hamas, da Jihad Islâmica, do Hezbollah, dos houthis com os teocratas do Irã e do Catar, com os ditadores de outros tantos países que não ficariam tristes em ver Israel desaparecer do mapa.
Ao contrário do que afirmam os anti-sionistas, o antissemitismo prova, como se preciso fosse, a necessidade vital de existência de um Estado judaico. Os judeus têm o direito de viver em sua terra ancestral. Tanto a extrema-esquerda quanto a extrema-direita tem de se dar conta dessa realidade.
Israel tem o direito de existir, assim como a Palestina, em paz, cooperação, soberania, dentro de fronteiras seguras e reconhecidas internacionalmente. Os colonatos têm de ser abandonados. As negociações, sem Netanyahu e seu governo, precisam começar no dia seguinte ao cessar-fogo. Serão difíceis, provavelmente longas, porém imprescindíveis.

Não Lula, Israel não é terrorista

Não Lula, Israel não é terrorista

Há quase um ano nós, do Coletivo Lula-Alckmin, passamos a maior parte do tempo batalhando em busca dos votos que acabaram fazendo a diferença para eleger presidente Luis Inácio Lula da Silva. Tínhamos então a íntima convicção que desta maneira estávamos ajudando a salvar a democracia no Brasil. Estávamos certos. Deste ponto de vista Lula não nos decepcionou, mostrou que é um democrata, ao contrário de seu adversário político. Gostaríamos que as mudanças fossem mais rápidas e profundas, mas reconhecemos as dificuldades de se ter um Congresso hiper-conservador e corrupto como o brasileiro.
O combate foi intenso, a luta insana.
Talvez por isso o mal estar que sentimos hoje seja tão grande, a tal ponto que muitos dentre nós, sobretudo os judeus militantes do PT, preferem fechar os olhos. A verdade porém deve ser dita, muito embora doa. A exemplo do que fez o seu predecessor durante 4 longos anos, o presidente abraçou a linguagem e a narrativa fácil das redes sociais. Tão logo o grupo de de 34 brasileiros vindos de Gaza pisou em Brasília, Lula abandonou o equilíbrio e neutralidade da política externa de seu governo ao comparar Israel com o Hamas. Referiu-se novamente à barbárie longamente planejada e executada pelo Hamas, com uma crueldade raramente vista, como ato terrorista, para depois acrescentar: “Israel também está cometendo vários atos de terrorismo”.
Sabemos de longa data que Lula às vezes não utiliza as palavras mais adequadas para qualificar atos e pensamentos. Contudo, um presidente da República, e muito menos um chefe de Estado que tem a pretensão de ser um líder mundial e pesar nas grandes resoluções, não tem o direito de confundir supostos crimes de guerra com terrorismo.
Poder-se-ia argumentar em seu favor que Lula quis “apenas” exteriorizar sua emoção diante da imagem insuportável de crianças mortas, demonstrando assim, mais uma vez, seu humanismo. Mas na melhor das hipóteses esta é uma meia-verdade. Dias atrás, na Conferência de Paris sobre a ajuda humanitária à Gaza, ao falar como representante oficial do Brasil, portanto como porta-voz do presidente, Celso Amorim usou o termo genocídio ao se referir a Israel.
Ora, Israel não comete genocídio em Gaza, mesmo se alguns membros extremistas de seu governo o desejassem.
Em 1944, ao tentar encontrar palavras para descrever as políticas nazistas de extermínio sistemático dos judeus, o advogado judeu polonês Raphael Lemkin criou a palavra “genocídio” do grega geno-, que significa raça ou tribo, e da palavra latina -cídio, que quer dizer matar. Com este termo, Lemkin definiu o Lemkin definiu o genocídio como “um plano coordenado, com ações de vários tipos, que objetiva à destruição dos alicerces fundamentais da vida de grupos nacionais com o objetivo de aniquilá-los”.
Isso significaria que Israel tem usado a força para aniquilar os palestinos de Gaza. É um absurdo, e tanto Amorim como Lula sabem disso. Como sabem que o objetivo do Hamas, aí sim, é cometer um genocídio para acabar com Israel e com o povo judeu. Isto está escrito, preto no branco.
Se Israel aceitasse a hipótese de cometer genocídio já o teria feito, pois possui os meios militares de acabar com a guerra e com a população palestina de Gaza. Mas não o faz e não o fará.
Terrorismo, como escreve Mariliz Pereira Jorge na Folha de S. Paulo, “é o uso sistemático de violência para criar um clima de medo generalizado por meio de assassinatos, massacres, raptos, atentados … Foi o que o Hamas fez. Não há notícias de que o Exército de Israel, por mais letal e condenável que seja sua ação, esteja estuprando mulheres, arrastando-as pelas ruas, assassinando pais na frente de filhos e vice-versa, queimando e decapitando gente ainda viva, com o único objetivo de aterrorizar as pessoas e pelo prazer de matar.”
Se Lula demorou duas semanas para chamar o Hamas de grupo terrorista foi provavelmente porque ficou “desconfortável” em desagradar seus eleitores radicais de esquerda, deputados e senadores do PT, PSOL e demais partidos que apoiam abertamente o Hamas, considerando-o um movimento de resistência; pouco importa se estupra, se esquarteja e queima pessoas vivas, se assa um bebê num forno, se despedaça um feto.
Lula quis denunciar as forças israelenses por violação da Convenção de Genebra, por estar matando civis. O problema é que não dá para reconhecer o direito de resposta de Israel e ao mesmo tempo acusá-lo de matar crianças, mulheres, velhos, doentes, quando o Hamas os utiliza (como o próprio grupo terrorista reconhece) como escudos humanos. De um lado se reconhece o direito – e até o dever – dos soldados de Tsahal levarem adiante a guerra, mas de outro não pode atingir os hospitais que servem de centros de comando militar do Hamas, não podem atingir as escolas, onde se escondem os terroristas, não podem atirar em ambulâncias que transportam terroristas para zonas de túneis que levam à Israel, e assim por diante, a lista é longa. O Hamas chegou a impedir e até atirar para matar palestinos que tentavam deixar o norte de Gaza em direção do sul. É evidente que o grupo terrorista quer o maior número possível de mortes palestinas para poder responsabilizar Israel e ganhar a guerra das narrativas.
O mundo, incluindo o presidente brasileiro, pode argumentar que Israel não tem o direito, qualquer que seja o contexto, de matar civis. O que ninguém pode fazer, honestamente, é se referir unicamente a Israel, sem uma palavra sequer destinada ao Hamas e aos países que o financiam, a começar pelo Irã e Catar, que têm sobre ele uma real influência.
Se Lula quer ser útil, ouso sugerir que proponha então um plano de paz, que comece simultaneamente pelo cessar-fogo, a libertação de todos os reféns, a entrega de todas as armas em mãos do Hamas, a dissolução do movimento terrorista, a saída das tropas israelenses de Gaza, concomitante à entrada de uma força internacional majoritariamente árabe, a transferência do governo de Gaza à Autoridade Palestina e abertura de negociações com vistas à transferência dos colonos judeus para Israel e à criação de um Estado Palestino soberano.
Neste momento, a extrema-esquerda abraça a causa do Hamas, preconiza o fim de Israel em nome de um antissemitismo fantasiado de anti-sionismo. A palavra de ordem é Free Palestina – Palestina livre, como se houvesse democracia em Gaza e não um regime autocrático, uma teocracia obscurantista, que discrimina mulheres e mata homossexuais. O Hamas é um grupo terrorista, de extrema-direita; a esquerda radical sabe disso e o apoia.
Sim a um Estado Palestino democrático, soberano, vivendo em paz e cooperação com Israel. Afinal, foi o que sempre defendeu, e espero que não perca isso de mira, o presidente Lula.