Mídia digital, extremismo e regulamentação
A imprensa–cujo objetivo é reportar os fatos, verificá-los a fim de transmiti-los ao público– e sua liberdade só são garantidas quando não ferem os princípios da ética jornalística. A ruptura desse princípio não pode ficar impune tampouco o veículo que a perpetrou. Dois casos mostram como o abuso da liberdade de imprensa está sendo contido no Brasil. No entanto, a falta de regulamentação das plataformas de mídia digital faz com que canais digitais se transformem em multiplicadores de um fenômeno da contemporaneidade chamado ‘a crise da verdade’.(Hoggan e Kloubert, 2022) Este fenômeno se calca na difusão da distorção dos fatos e tem como consequência a divisão quase pela metade dos indivíduos numa dada sociedade sobre a percepção objetiva e histórica dela. Essa divisão é promovida pela velha máxima de Júlio Cézar “dividir e conquistar”, foi estratégia de Joseph Goebbels durante o nazismo e é ainda utilizada pelos governos de ultradireita para fomentar o ódio e polarizar a população. Isso tem que ser contido.
A Jovem Pan News é um exemplo desse acervo de fake news, propaladas para consolidar o governo de extrema direita de Bolsonaro entre 2018 e 2022. Em 1942, Antônio Augusto Amaral de Carvalho funda a Jovem Pan, uma radiodifusora que hoje faz parte do histórico jornalístico do país, contando com sua expansão em 100 emissoras, entre canais de notícias e plataformas, espalhadas pelo território brasileiro. Dois programas são o carro-chefe da emissora: “Morning Show” e Os Pingos nos Is Estreado em 2012, “Morning Show”, inspirado no formato americano de shows de matinê, no início contava com a com a chefia do jornalista Zé Luiz que um ano após deixou o programa por desavenças com a produção. O “Morning Show” foi progressivamente se transformando em canal proliferador de lorotas quando em 2021 ajudou a impulsionar desinformação sobre a pandemia de Covid-19. O negacionismo sobre os efeitos letais do vírus se deu ao mostrar entrevistas com médicos no YouTube, defendendo drogas sem eficiência comprovada e com críticas ao uso de máscaras. Uma das comentaristas do programa, a influenciadora digital Zoe Martinez, é investigada pelo Ministério Público Federal (MPF) por incitar o golpe no dia 08 de janeiro na invasão dos três poderes. Martinez defendeu que as Forças Armadas destituíssem os ministros do Supremo Tribunal Federal. A caribenha naturalizada brasileira cresceu e enriqueceu às custas das plataformas digitais e na alocação de vídeos e comentários contra o comunismo. Sem nenhuma sustentação teórica e sem bases históricas, a influenciadora ratifica o mito de uma falência comunista em Cuba sem apresentar nenhum outro contraponto; produzindo, assim, uma visão tendenciosa sobre esse cenário. Uma pergunta fica. Por que a Jovem Pan só a demitiu quando o MPF foi acionado?
O mesmo aconteceu com os comentaristas da corporação Paulo Figueiredo e Rodrigo Constantino. Figueiredo e Constantino ambos residentes nos EUAs, utilizam o mesmo apelo da primeira emenda constitucional americana para defender a liberdade de imprensa no Brasil e instituir a indecência e antiética jornalísticas. Figueiredo é neto do último presidente militar e ex-sócio de Donald Trump na rede de hotelaria, seguidor do já defunctus guru Olavo de Carvalho. Além do processo de investigação do MPF da Jovem Pan, o ardil é réu de um esquema corrupto apelidado de Operação Circus Máximo em que Figueiredo responde por falcatruas de 20 milhões de reais entre propinas de diretores do Banco de Brasília e a empresa dele na construção da Trump Tower no Rio de Janeiro. De novo, a Jovem Pan só o despediu depois que o MPF se manifestou.
Já Constantino foi taxativo ao afirmar que houve golpe do Supremo Tribunal Federal no resultado das eleições de 2022 que elegeu o candidato Luís Inácio da Silva. Constantino, detentor de uma fortuna de 50 milhões de reais, já passou pela Veja, O Globo, Valor Econômico como colunista e comentarista de economia. Como escritor, seus títulos revelam o perfil de extrema direita na atuação de sua carreira. Um deles é Esquerda Caviar (2014) cujo nome manifesta a posição pejorativa com a qual Constantino trata a oposição no Brasil. Outras produções em palestras denotam a tese central que circunda o seu trabalho, replicando o cerne da ideologia neoliberal no século XXI expressa na seguinte equação: o aumento da produtividade de uma dada sociedade é igual ao aumento da inequidade social, retirando desta sociedade os pobres e idosos. A mesma estratégia da Jovem Pan sobre a demissão se aplica ao infrator.
Tanto em formato radiofônico como digital, Os Pingos nos Is começam com o jornalista Reinaldo Azevedo em 2014, visando oferecer um panorama geral de notícias políticas com comentaristas e críticos. Azevedo, envolvido num suposto áudio comprometedor com a irmã de Aécio Neves, pede demissão em 2017 e o programa se delineia, então, como ultraconservador. Entre 2020 e 2022, Os Pingos nos Is têm em seu quadro os comentaristas Augusto Nunes, Ana Paula Henkel, Guilherme Fiuza e Guga Noblat. Os três primeiros foram responsáveis pela defesa do bolsonarismo, e, diretamente, pelo crescimento do homicídio, feminicídio e de todo potencial destruidor de uma sociedade, corroborado pela fome, miséria, doenças, baixa qualidade na educação, e sistema de saúde pauperizado, etc. Nunes foi demitido porque o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impedi-o de chamar o atual presidente de “ex-presidiário”. Henkel se demitiu, Fiuza teve seus perfis sociais suspensos por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF). Guga Noblat, no modelo fake copiado da Fox News americana, tinha o papel mediador no debate, apresentando contra-argumentos aos temas como forma de equilibrar o rol altamente faccioso do show. Pediu demissão da Jovem Pan News em 2022.
Nunes é o exemplo de um extremista latente em que os princípios e atos ultraconservadores se manifestam na medida em haja uma liderança que os avalizam. Com uma carreira longa no jornalismo, Nunes trabalhou como repórter no Estado de S. Paulo e revista Veja, mediou entrevistas no Roda Viva e na TV Cultura, dirigiu as revistas Veja, Época e a Forbes brasileira, os jornais Jornal do Brasil e Zero Hora, for fim, foi amplamente premiado na sua função. No entanto, pelo menos na aparência, sua conduta muda justamente quase um ano após a vitória de Bolsonaro quando Nunes esbofeteia o jornalista Glenn Greenwald ao vivo no show Pânico da Jovem Pan. Greenwald, assumidamente casado com o deputado federal David Miranda e os dois sendo pais adotivos de dois filhos, investigava o imbróglio que colocou o presidente Lula na cadeia. A redação da Pan liberou uma nota se desculpando sobre o comportamento do jornalista. Contudo, nenhuma advertência ou punição mais severa veio da emissora, muito pelo contrário, ela só se pronunciou no momento em que o TSE se manifestou contra a retórica vilipendiosa do jornalista contra Lula.
Surpreendentemente, Fuiza é neto do jurista Sobral Pinto e com uma carreira difusa no jornalismo e na literatura tombou para a ultradireita, defendendo o discurso do ódio e tomando uma postura antidemocrática.
A resposta à negligência da Jovem Pan face à responsabilidade de seus profissionais reside no que é conhecido como capitalismo predatório. Neste sistema, o foco central é o lucro e notadamente o ganho que a veiculação da imagem e da notícia trazem no índice de audiência da corporação comunicativa junto com a influência política e o poder que geram. Neste tipo de comunicação, não cabe nenhum comprometimento ético do profissional e nem da empresa que o representa, muito menos as consequências em que esse veículo produz direto na população (a desinformação elevando o número de vítimas da Covid-19, etc.), ou seja, sua capacidade em provocar mortes. Como representação latente, esta máquina de poder comunicativo funciona conforme a teoria freudiana da psique. O Id social é um depositório das forças inconscientes contra tudo o que é progressista e diferente do padrão de ideias e comportamentos da época e encontra um superego (líder) que lhe escancara a porta para se manifestar. A Jovem Pan serviu de canal para todos aqueles que cultivaram o ódio da diferença se expressarem e só foi barrada agora por pais disciplinadores (STF e TSE). Neste país, precisamos mais desses pais em formas de leis e decretos que impeçam as plataformas digitais de lesionarem a ética com que o jornalismo se compromete. Precisamos desenvolver a consciência de que este é o fio condutor que o capitalismo usa para continuar empreendendo suas desumanidades.
Olhos nos olhos
Ao discursar na sessão de reabertura do Ano Judiciário no STF, no último dia 1° de fevereiro, portanto após a invasão dos 3 Poderes protagonizada pelos vândalos fascistas , o procurador-geral da República, Augusto Aras, voltou a se ilustrar. Mostrou-se indigno, amoral, sem vergonha nem brio. Antonio Augusto Brandão foi mais Aras do que nunca; covarde. Inventou uma desculpa, mais esfarrapada impossível, para declarar que graças à sua ação – ou omissão – o Brasil se manteve democrático. Embora a verdade seja outra, a democracia renasceu apesar do Ministério Público Federal e não graças a ele.
Aras devia ter aproveitado a ocasião para renunciar ao cargo e assim permitir que, em seu lugar, seja nomeado um verdadeiro procurador-geral da República. Entretanto, como era de se esperar, fez exatamente o contrário. Dirigiu-se ao presidente da República e, na maior “caradura”, disse que teve atuação ” estrategicamente discreta” sob o governo Bolsonaro pela boa causa. Dessa maneira teria evitado que “extremistas de todas as naturezas e ordens manifestassem contra o regime democrático”.
O discurso de Aras no STF foi risível, se não fosse trágico. O PGR não foi discreto, como agora afirma, foi cúmplice dos crimes de Bolsonaro. Hoje, declara ser generoso e fiel à Constituição. Quanto à generosidade, não faz parte de suas atribuições, bastava ter sido fiel à Lei Magna. O que não foi nos últimos 4 anos.
Seu papel era criar as condições judiciais para que os responsáveis por crimes hediondos, como por exemplo os cometidos durante a pandemia, fossem condenados e devidamente punidos. Aras prevaricou. Foi diretamente responsável por evitar a atuação da Justiça.
Com a sua fiel escudeira bolsonarista Lindôra Araújo, que ganhou a vice procuradoria depois de ter pedido o arquivamento das investigações do capitão sob o argumento mentiroso de que não havia provas científicas de que as máscaras protegiam contra o coronavírus, tiveram até hoje um só e único objetivo: evitar que a PGR cumprisse o seu dever de representar a sociedade. Ambos foram meros advogados, além de tudo medíocres, da família Bolsonaro e seus asseclas. Agiram como se estivessem a mando do Palácio. Assim atuaram nos últimos quatro anos.
Agora, vem ressaltar o trabalho da Procuradoria Geral da República contra os golpistas do dia 8 de janeiro e tentar compensar a leniência que o caracterizou. A PGR ofereceu 525 denúncias, 14 pedidos de prisão e 9 requerimentos de busca e apreensão.
Aras protelou enquanto pode, mas não teve outra saída. Foi a Advocacia Geral da União que pediu ao Supremo, no próprio dia 8, a prisão em flagrante dos golpistas envolvidos nos ataques e a de Anderson Torres, secretário da Segurança do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça de Bolsonaro.
Como sempre, Aras tentou empurrar com a barriga. Só depois anunciou a criação do Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos, com o objetivo de “identificar os núcleos de comando do movimento” e as “autoridades com prerrogativa de foro que tenham participado, cooperado para ou incentivado” os ataques.
Aras também foi pressionado pelos seus comandados. Em carta assinada por 184 integrantes do MPF, foi cobrado a apurar envolvimento e omissão de autoridades do governo nos atos golpistas registrados no país. Para os procuradores, a investigação da relação de autoridades com os movimentos responsáveis por esses atos é fundamental, bem como o pedido de instauração de inquérito policial para apurar a ação criminosa dessas autoridades que gozam de foro privilegiado.
Teve de sair de sua toca.
Augusto Aras é cínico, insolente. Teve a desfaçatez de, olhos nos olhos de Lula, em pleno STF, pronunciar uma ode à democracia.
“Nós, cidadãos do estado democrático de direito, precisamos dizer todos os dias: democracia eu te amo, eu te amo, eu te amo, porque esta democracia conquistada a duras penas exigiu sangue, suor e lágrimas de muitos brasileiros e de muitos outros que não antecederam no processo civilizatório”.
Antonio Augusto Brandão, o Brasil que derrotou a barbárie o dispensa de tamanha ternura, desse triplo “eu te amo”, que ousa falar em processo civilizatório e ao mesmo tempo viola a Constituição.
Chega de declarações de amor hipócritas, este Brasil exige “apenas” a aplicação do Direito. Nada mais, nada menos.
Um Nuremberg para Bolsonaro
O insuportável espetáculo de morte na reserva indígena yanomami, por desnutrição e malária, é a consequência direta e indiscutível do governo genocida que, nos últimos quatro anos, destruiu o Brasil. São as mesmas imagens de crianças vítimas da guerra de Biafra, só pele e osso, que no final dos anos 60 atravessaram o mundo, com a diferença de que as atuais têm origem nos Estados de Roraima e Amazonas. 570 crianças yanomami de menos de 5 anos de idade morreram nos últimos quatro anos e outras tantas estão condenadas.
Segundo o ISA, Instituto Socioambiental, a terra yanomami é habitada por oito povos, muitos ainda isolados, possui cerca de 26,7 mil habitantes e compreende uma área de 9,6 milhões de hectares, equivalente a quase 14 mil campos de futebol.
Em visita à região, Lula qualificou a situação como desumana. E ao decretar estado de emergência, tenta salvar o que ainda pode ser salvo. O presidente da Funai qualificou o que viu de catástrofe humanitária. O cenário é dantesco.
Há quem ouse, embora sejam cada vez menos numerosos, contestar o termo genocídio. O próprio ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, rendeu-se às evidências; determinou a abertura de um inquérito para “apurar o crime de genocídio” na região.
Está se aproximando o dia em que o ex-presidente de tantos e tão espantosos crimes será extraditado ou expulso dos Estados Unidos, devendo então retornar ao Brasil. Por isso, é urgente que a sua responsabilidade seja apontada, investigada e decretada a prisão preventiva. Ao por os pés no país, Jair Messias Bolsonaro deverá ir direto da pista do aeroporto para o camburão e daí para a Papuda. De onde, se justiça houver, nunca mais sairá.
É essencial que se bata nessa tecla, pois não poderemos contar com o procurador-geral da República, Augusto Aras, que apesar de tantos pesares, de provas cabais, ainda tenta achar uma forma de inocentar Bolsonaro. Aras é cúmplice. A sua eventual recondução ao cargo, que anda sendo comentada, é pura sandice.
Bolsonaro tem de ser punido, ninguém tem o direito de minimizar nem muito menos anistiar genocidas. Ninguém, nem dentro nem fora do país.
O Tribunal Penal Internacional de Haia, que aceitou examinar o pedido da Comissão Arns de abertura de uma investigação formal de Bolsonaro pela prática de genocídio e crimes contra a humanidade ao encontro das populações indígenas, agora se vê reforçado. Na verdade, já foram apresentadas ao Tribunal três denúncias, a última delas preparada pela Apib, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, ou seja pelas próprias vítimas.
Esse documento descreve condutas que configuram crime de genocídio. Por exemplo, quando um indivíduo causa lesão grave à integridade física ou mental de um grupo específico. Quando subtrai, intencionalmente, as condições necessárias à existência desse grupo, até o ponto de ameaçar a vida desses povos. No caso dos crimes de Bolsonaro, um elemento essencial são os direitos territoriais. Além de não demarcar terras indígenas, ao contrário do que estipulam as ridiculamente denominadas 4 linhas da Constituição, o ex-presidente incentivou a invasão desses territórios, acabou com a fiscalização, desativou a Funai, estimulou a prática do garimpo ilegal e da mineração, do agronegócio, da pesca ilegal, do desmatamento, e adotou medidas que provocaram destruição ambiental e deixar o “gado passar”. No documento da Apib, fica claro que, por meio de práticas e discursos, trabalhou para a construção de uma “nação sem indígenas”.
A denúncia ampliou a pressão internacional contra o governo brasileiro, com sua reputação minada por atitudes consideradas inaceitáveis no campo do meio ambiente, na pandemia e em direitos humanos.
Sua “política anti-indígena incitou, facilitou e deixou de combater as invasões às terras indígenas, o garimpo ilegal, o desmatamento e a contaminação – por mercúrio, minérios ou Covid-19 -, afetando a vida, a saúde, a integridade e a própria existência dos povos indígenas no Brasil…”
A tragédia yanomami não é obra da incompetência e da inação. Trata-se, assim como no holocausto, de uma política de destruição sistemática, meticulosa, em grande escala.
Os problemas na região eram conhecidos de longa data; Bolsonaro ignorou 21 pedidos de socorro, sua fiel escudeira Damares pediu ao então presidente que vetasse água, leitos de UTI e ventiladores para indígenas na pandemia.
O garimpo instalou-se dentro da região yanomami com uma força que não se via desde antes da demarcação do território, em 1992, por decreto de Fernando Collor.
Bolsonaro não foi apenas omisso, como presidente chegou a visitar um garimpo ilegal na região de Raposa Serra do Sol, provocando a aceleração da mineração ilegal em toda a região.
Na cabeça de Bolsonaro e sua gangue, a floresta amazônica é uma imensa área desperdiçada, que deveria ser ocupada com pastos, plantações e todo tipo de exploração capaz de produzir “riqueza” a qualquer custo. Se os yanomami são um obstáculo, devem desaparecer, pois não servem para nada.
Vale lembrar que quando era deputado, Bolsonaro fez um discurso em que elogiou a cavalaria norte-americana por ter dizimado populações indígenas e “acabado com esse problema”.
Bolsonaro matou e continua matando nossos povos originários. O STF não pode ignorar. O TPI tampouco, mesmo porque a responsabilização criminal dos órgãos máximos de um Estado por questões relacionadas com a saúde pública não é uma novidade para o Tribunal Penal Internacional. Em 2009, entre os crimes cometidos no Darfur imputados ao ex-Presidente sudanês Omar al-Bashir está a expulsão de 13 organizações humanitárias que a Organização Mundial da Saúde entendeu como uma decisão passível de conduzir ao aumento da mortalidade devido à interrupção de cuidados de saúde. Mais recentemente, em 2018, a Human Rights Watch pediu ao TPI para julgar os autores de homicídios cometidos no Nordeste da República Democrática do Congo por entender que tais ataques dificultavam os esforços para controlar o surto de Ébola e poderiam ainda estender a ameaça à saúde pública para Uganda.
No caso brasileiro, vale lembrar a expulsão de fato dos médicos cubanos do Brasil, a legalização do garimpo em terras indígenas, ou ainda o abandono das comunidades indígenas durante a pandemia.
Não dá para esquecer que JMB tentou vetar um projeto de lei e barrar uma decisão do Supremo para que o Estado distribuísse água potável, sabonete para lavar as mãos, cestas básicas, ou seja comida, e garantir vaga em hospital para os índios com Covid. Não se trata de descaso e sim de uma ação deliberada. Sua responsabilidade é direta, real, e ultrapassa em muito a mera omissão.
Não necessitamos mais provas para entender que o bolsonarismo precisa ser combatido. A sobrevivência da democracia depende dessa vitória. O primeiro passo, sine qua non, é a condenação de seu líder e daqueles que participaram da aventura nazifascista.
A Justiça precisa passar. Pelo mal que fez, Bolsonaro não merece o direito de viver livre entre nós.
Ele e os seus bem que tentaram, mas não conseguiram exterminar completamente nossos índios, nossa gente, nem o Brasil. Devem pagar por isso o preço mais alto, a severidade de um novo Nuremberg. Para sempre.
Salve Brasil, salve
É impressionante a quantidade de “sem noção” que participaram dos atos terroristas em Brasília. Olhando os vídeos e as fotos se destacam gente comum, tiazinhas do WhatsApp, casais de meia idade, todos eles em atitudes que nunca sonharam se encontrar.
Vejo eles dizendo que estão lá para lutar pela liberdade, contra o ladrão, contra o aborto, contra o comunismo a legalização das drogas. Pessoas que acreditam realmente nesta agenda apócrifa sem base alguma na realidade.
Estas pessoas eram solitárias e agora encontraram uma espécie de família acolhedora, um propósito de vida. Deram a elas um objetivo, de salvar a pátria e elas assumiram como uma missão divina. Eram invisíveis na sociedade e agora circulam nas redes sociais como heróis e heroínas.
Este fenômeno sociológico foi aproveitado por um grupo de golpistas que financiam esta gente. Uma vez convertidos para a causa, são alimentados e pagos para permanecerem em acampamentos, fecharem rodovias e agora invadirem os prédios símbolos da democracia. Eles agora têm a importância e a relevância que nunca tiveram antes em suas vidas medíocres.
Se de parte da sociedade que defende a democracia eles merecem somente desprezo e repúdio, da outra, são vistos como destemidos defensores dos bons costumes. E nesta parte da sociedade as informações são de que seus esforços não são em vão e que eles representam o baluarte dos desígnios da nação, em nome de Jesus.
Acreditam piamente que seus atos vão trazer de volta Bolsonaro ao poder. Não medem consequências e mal sabem o que os aguarda quando o braço forte da justiça cair sobre eles. Vão responder a processos que podem determinar muitos anos de prisão além de responsabilidades pelo pagamento dos prejuízos causados ao erário público.
As atitudes desta horda envergonharam a nação. Seus crimes não ficarão impunes, mas nada disto será suficiente. É preciso ir a fundo, encontrar os meios para impedir que a mensagem continue sendo enviada. Temos de combater as Fake News também de maneira científica. Empregar meios que impeçam a propagação de notícias enganosas e manipuladoras.
O que assistimos ontem a noite foi o desfecho de uma ação ordenada e coordenada. O planejamento ocorreu com muita antecedência e jamais teria acontecido da forma como vimos sem a participação de autoridades coniventes. Toda rede bolsonarista é monitorada pelos serviços de inteligência das polícias estaduais, pela polícia federal e pela Abin. Estes monitoramentos produzem informes reservados que seguem para as chefias dos órgãos de segurança, secretários de segurança e governadores. Todos estavam cientes.
O governador afastado do DF, Ibaneis Rocha, seu secretário de segurança pública exonerado, Anderson Torres, além do comandante-geral da PM, coronel Fábio Augusto, devem ser responsabilizados diretamente pelos atos antidemocráticos. Foram eles os principais articuladores de tudo o que aconteceu.
Nenhum ônibus foi impedido de chegar, os terroristas foram escoltados pela PM até a praça dos 3 poderes onde uma dúzia de policiais fazia a “segurança” do local. Se passou cerca de uma hora e meia até que uma ação tímida das forças de segurança tomasse alguma atitude. Enquanto isso, policias conversavam animadamente com os vândalos.
Além deles, os financiadores que pagaram pelo envio dos ônibus lotados de golpistas, mais os parlamentares que incentivaram os atos, todos precisam ser responsabilizados. Ninguém pode ficar impune.
Hoje o país vai acordar literalmente juntando os cacos do que foi destruído ontem. Até mesmo obras de arte foram vandalizadas. O prejuízo em cada prédio será de milhões, muita coisa irrecuperável. Um dia de enorme tristeza para uma país que acaba de se livrar de um fascista e realizar uma eleição que trouxe de volta o presidente com o maior índice de aprovação de governo da história.
Levanta Brasil, fascistas não passarão.
Equipe de Bannon dirigiu campanha de Bolsonaro
O Brasil transformou-se no laboratório da extrema-direita mundial, no centro do combate ao globalismo. Segundo Buonaventura de Sousa Santos, Diretor Emérito do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, em artigo publicado dia 1 de novembro no jornal Publico, de Lisboa, “informações fidedignas dão-nos conta de que as empresas de desinformação e de manipulação eleitoral ligadas ao notório fascista Steve Bannon estiveram instaladas em dois andares de uma das principais ruas de São Paulo, de onde dirigiram as operações da campanha de Bolsonaro.”
Ficou evidente, nessas eleições, a internacionalização do ataque à democracia brasileira, por meio de organizações fascistas globais originárias e financiadas por um lado pela plutocracia norte-americana pro-Trump, de outro por Moscou, que se tornou o maior apoiador da extrema-direita europeia.
Os próximos objetivos eleitorais serão as eleições legislativas norte-americanas, dentro de alguns dias, e a presidencial de 2024, tendo como principal candidato Donald Trump. O mesmo Trump que recentemente, ao enviar uma mensagem aos brasileiros, considerou Jair Bolsonaro um dos maiores líderes mundiais.
No Brasil, de acordo com Buonaventura, a extrema-direita mundial já se prepara para a próxima etapa, visando a nova fase do golpe continuado, que teve seu inicio no impeachment de Dilma Roussef. “Será, provavelmente, a contestação dos resultados; e depois, a utilização do crime organizado e do poder legislativo para intimidar e criar instabilidade, com ameaça, a médio prazo, de impeachment de Lula.