No último dia 10, o presidente Lula apoiou oficialmente a denúncia por genocídio contra Israel, de autoria da África do Sul, na Corte Internacional de Haia. 14 países seguiram o mesmo caminho. Desse total, 13 não respeitam os direitos humanos nem podem ser chamados de democráticos. Mas aparentemente este tipo de reflexão não é levado em consideração; nas relações internacionais o que conta são os interesses de cada um, tanto os nacionais quanto os pessoais. É o caso do Brasil de Lula, que não está nem um pingo preocupado com a verdade e menos ainda com o aumento do antissemitismo, que cresceu “apenas” 1.000% no país, desde o início da guerra entre Israel e o Hamas.
O governo não tem hesitado em jogar no lixo o tradicional equilíbrio da sua política externa, a moderação que tantos elogios e respeito trouxeram à diplomacia do Itamarati nos tempos pré-Bolsonaro.
Talvez sem nem sequer se dar conta, Lula, ao aderir à denúncia, abriu a porteira para que a sua boiada passasse aos berros, distilando antissemitismo. Foi o aval que faltava.
Representando o Brasil na ONU, Celso Amorim foi o primeiro, ao acusar Israel de genocídio muito antes de Pretória; seguiram a presidenta do PT, Gleisi Hofman, Janja, a primeira-dama, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, o ex-presidente do PT, José Genoino.
Gleisi defendeu quem chamou os judeus de ratazanas, numa alusão às perseguições sofridas na Idade Média, quando foram acusados de espalhar a peste, e ainda acusou a Conib, entidade representativa dos judeus brasileiros, de traição por agir “em nome de Israel”. Uma acusação que lembra a condenação do capitão Dreyfus pela Justiça francesa, pelo simples crime de ser judeu.
Quanto a Genoino, teve a ousadia de propor o boicote de empresas de judeus, fato que em 1938 precedeu a tristemente célebre Noite dos Cristais, em que sinagogas e negócios de judeus foram destruídos.
O ministro Mauro Vieira publicou uma nota na qual explica a posição brasileira, porém, provavelmente envergonhado, evita afirmar que Israel comete genocídio.
Mesmo assim, alguns judeus de esquerda, que como eu passaram dias e noites a fazer campanha pró Lula (e que militam pela solução de 2 Estados), ainda acreditam na boa fé do presidente, que talvez esteja sendo mal orientado e que precisaria portanto ouvir o que essa parcela do seu eleitorado tem a dizer.
Quanto à primeira-dama, lançou um manifesto em defesa das mulheres palestinas, sem nem uma palavra sequer sobre o pogrom sexual sofrido pelas israelenses no dia 7 de outubro: mulheres estupradas, esquartejadas, mutiladas, que chegaram a ter seus fetos arrancados de dentro do ventre materno e assistiram a monstruosidade de ver seus filhos assados vivos num forno. Nada disso parece tê-la sensibilizado. Janja só viu violência de um lado. Mesmo assim o presidente, apaixonado, declarou: – Ela é o meu farol.
A verdade é que a política externa derrapou e que Lula optou por acariciar a pseudo esquerda pró Hamas, que talvez seja o grosso de seu eleitorado, sobretudo no sul do país.
Tudo isso provoca antissemitismo, é lenha na fogueira do ódio. A memória da Shoah foi banalizada.
Lula parece não estar nem aí com o antissemitismo que se espalha pelo país, como se não lhe dissesse respeito. Se o Brasil optou pela adesão à denúncia sul-africana parece ter sido por duas razões: a primeira, eleitoral, óbvia; a segunda, uma jogada de política externa, uma espécie de ação de força do Sul Global, tão caro ao presidente. Que a denúncia tenha sido feita por Pretória, país membro dos BRICS, foi uma dádiva para o fortalecimento do grupo que teve o Brasil na linha de frente. O Sul Global, mais a Turquia, o Irã, a Arábia Saudita, enfim os países que querem desempenhar um papel na futura ordem mundial, como é o caso do Brasil – e de Lula, só podiam apoiar a denúncia de genocídio, que atinge os Estados Unidos e seu amigo, o “Israel colonial”.
A gesticulação faz parte da guerra contra o Ocidente. O presidente brasileiro escolheu o seu campo e espera tirar benefício, inclusive pessoal, de sua opção. Lula certamente ainda sonha em vir a ser uma liderança mundial, por isso seu caminho será pautado pela Rússia, China, Índia, pelo Sul Global, não por Washington nem por Bruxelas. Nessa nova ordem mundial pouco importa a ideologia, os valores, a democracia, os direitos humanos, o estado de direito. Vale tudo e não são mil por cento a mais de atos antissemitas, uns pogroms aqui outros lá, a invasão de um país (a Ucrânia), que vão atrapalhar a construção em andamento desse novo mundo em que nós, judeus, corremos o risco de ser, uma vez mais, bodes expiatórios.
A existência de Israel está ameaçada, por razoes externas e internas. E a nossa existência como judeus da diáspora (incluindo os brasileiros), também.
Em contrapartida, a pseudo esquerda e a extrema-direita exultam.