Somos dois povos desgraçados. O mundo nos perseguiu e continua a nos perseguir através dos séculos da história. Nós judeus, que muitos dizem sermos o povo escolhido, somos recordistas em sobrevivência. Foram tantas tentativas de extermínio que nossa presença no seio das nações é um exemplo de perseverança. Os palestinos, também sentem o significado da discriminação, principalmente em sua história mais recente. Utilizados como joguetes de acordo com os interesses do momento no Oriente Médio, são outro exemplo de perseverança.

Não obstante este passado em comum, travam uma sangrenta batalha entre si. Se o mundo os despreza, eles tratam de desprezar-se ainda mais entre si. Invocam atrocidades cometidas no passado contra sua população, mas não temem perpetrá-las um contra o outro. Neste quesito, se esforçam bastante – num dia assassinam indiscriminadamente homens, mulheres e crianças, no outro relembram pogroms e o setembro negro.

Nem mesmo um acordo de intenções de paz é capaz de dar fim ao morticínio. Desde a sua assinatura, 24 israelenses e 36 palestinos já foram mortos. Tanta desgraça seria pouco se não fosse óbvio que ambos estão condenados a compartilhar o mesmo espaço de terra que disputam. Dois povos desgraçados que se culpam mutuamente por sua desgraça.

Neste clima sombrio, sobram cenas grotescas de pura barbárie. Um helicóptero israelense ataca um automóvel numa rua cheia de transeuntes. O resultado é a morte do procurado, sua esposa e filhos pequenos além de dezenas de feridos. Um avô passeia com suas netas por uma estrada quando uma saraivada de balas disparadas por um palestino, acerta o carro tirando a vida de uma menina de 7 anos e ferindo sua irmã de apenas 5.

Numa tentativa de manter as aparências, soldados de Israel enfrentaram uma turba de colonos que se negam a abandonar mais um posto ilegal habitado. Dezenas de feridos e detidos foram o saldo da ação em apenas uma das centenas de localidades que deverão ser abandonadas. Incentivos de desobediência civil se fizeram ouvir até mesmo de um deputado da Knesset. Entre os despojos, Coquetéis Molotov que não chegaram a serem utilizados, mas que demonstram, até onde já estão dispostos a chegar um bando de radicais extremistas, que sob o manto da religião, se proclamam defensores do solo sagrado da Grande Israel.

Do lado palestino as coisas também não são menos trágicas. Impossibilitado de impor a força sobre os grupos extremistas palestinos para um cessar fogo, Abbas, o primeiro-ministro palestino tenta de um lado impedir uma guerra civil e de outro salvar seu mandato e o mapa da paz. Tarefa mais difícil de ser concretizada quando nem mesmo as milícias que seguem as ordens de Arafat, parecem lhe dar ouvidos. Em nome da sua fé, querem libertar o solo sagrado dos infiéis.

Neste cenário dantesco, onde a razão não se faz escutar e a paixão associa-se a religião para jogar um povo contra o outro, o terror continua reinando sobre todos. Numa inversão de valores a morte passou a ser a razão para manter o conflito, enquanto a vida passou a ser um empecilho para se alcançar à paz. Os generais reinam soberanos enquanto os diplomatas são relegados a um segundo plano. A lógica da guerra vai cobrando sua dívida.

Em maio a tanta sandice, arautos do apocalipse tentam demonstrar direitos divinos e históricos para merecerem todo o território em disputa. Teorias risíveis que merecedoras de algum crédito fariam com que o outro povo simplesmente deixasse de existir, ou seriam capazes da remoção de milhões de pessoas para o limbo do além.

De nada adianta o choro e a dor das famílias enlutadas. Enquanto israelenses e palestinos não combaterem juntos o terror e os extremistas de ambos os lados com acordos de trabalho conjuntos e com ações em direção a paz, cada vez mais a violência se fará presente. Todo passo em direção a reconciliação é um retrocesso para os belicosos. Eles somente podem ser vencidos pela determinação em se encontrar um “modus vivendi” para israelenses e palestinos reconstruírem suas vidas longe dos dias intermináveis de violência que os acompanham há anos.

A voz da esperança continua bradando contra todos os gritos dos pessimistas que querem condenar estes povos a um confronto “ad eternum”. A paz vai se impor não obstante o desejo de uma minoria raivosa que tenta se sobrepor ao desejo da imensa maioria que não suporta mais a continuidade do conflito.

Este deverá ser mais um triste capítulo na história destes povos desgraçados. Mais um dos tantos obstáculos que tiveram de superar para sobreviverem. O último talvez, como inimigos, e o primeiro como povos livres convivendo lado a lado em paz e prosperidade.

Venceremos.