Este livro de Direito Civil – Teoria Geral do Direito Civil é publicado em caráter introdutório para estudos do Sistema de Direito Civil em chave constitucional.
Dizer “direito civil em chave constitucional” não é para simples (e necessária) hermenêutica hierárquica, mas para um Direito Civil que nasce com fundamentos na Constituição, irradiando-se em relações civilizatórias.
No 20º ano de vigência do Código Civil de 2002 e no 35º de promulgação da Constituição Federal de 1988, não é aceitável, e não é racional nem inteligente pensar em um Direito Civil isolado ou fechado (isso lembraria o mito da caverna de Platão). Hoje, referimo-nos, com inteligência, racionalidade e discernimento, ao Direito Civil que vive e respira constitucionalidade, direitos pétreos e direitos humanos.
Vejamos. Os microssistemas, legislações civis e decisões judiciais relacionados à igualdade e emancipação da mulher, aos direitos da personalidade, ou à pessoa consumidoras, criança, adolescente, homoafetiva, idosa, com deficiência, convivente e, também, à impenhorabilidade, relações familiares, adoção, função social dos contratos e da propreidade, responsabilização por danos morais (e perda de chance), reconfiguração do poder dos pais, biodireito, relações socioafetivas, não discriminação – e muito mais, demonstram que o Sistema de Direito Civil tradicional é insuficiente, sobretudo no Código Civil. São experiências sociojurídicas que, para além do sistema civilístico, objetiva um novo e vigoroso sistema de Direito Civil civilizatório.
Trata-se, assim, de um sistema de Direito Civil com fundamento constitucional e em direitos humanos que em nada perde sua característica basilar e sistêmica de disciplina das relações horizontais. Ao contrário, ganha ainda mais força, robustez, sentido e profundidade no âmbito e fontes constitucionais e humanistas.
Este livro (o primeiro de 5 volumes) está organizado em duas Partes:
I – Fundamentos Constitucionais e de Direitos Humanos para um Sistema de Direito Civilizatório além do Civilístico
II – Teoria Geral do Direito Civil: Pessoas, Bens e Fatos Jurídicos
O Plano geral em que os meus Estudos de Direito Civil foram pensados, desenvolvidos e escritos e que, agora, são oferecidos, de volume em volume, é:
Vol. I – Direito Civil – Teoria Geral do Direito Civil
Vol. II – Teoria das Relações Obrigacionais: obrigações, contratos e responsabilidade civil
Vol. III – Das Coisas, dos Direitos Reais e de seus Titulares
Vol. IV – Dos Núcleos Familiares e suas Relações
Vol. V – Das Sucessões
O Direito Civil desde as suas origens históricas e, em especial, após a Revolução Francesa, manteve um caráter privatístico, sobretudo nos sistemas codificados, com nítida separação entre público e privado.
Muitas matérias, entre as quais, o sujeito de direito, os bens, os fatos jurídicos, as obrigações e contratos, os direitos reais, as famílias e as sucessões, foram mantidas em um contexto de direito privado.
Porém, com o avançar do processo de constitucionalização, os direitos humanos foram se tornando direitos fundamentais, inseridos no texto constitucional como núcleo (imutável) do projeto constitucional de país como Estado Democrático de Direito.
No caso do Brasil, a Constituição Federal de 1988 abriu um universo de repercussão dos direitos fundamentais no direito privado, ora com aplicação imediata, ora como fundamento hermenêutico.
O Direito Civil nasce e se legitima na Constituição Federal e, em movimento dinâmico hermenêutico, carrega em seus dispositivos a substância constitucional.
É o Direito Civil em chave constitucional que rompe a dicotomia público-privado e propicia a humanização das relações jurídicas e, por isso mesmo, a pessoa deixa de ser simples sujeito de direito para elevar-se à altura de pessoa humana com dignidade com repercussões nas relações obrigacionais e de direitos reais, familiares e sucessórios.
Assim, os tópicos tratados neste livro, Pessoa, Bens e Fatos Jurídicos são as estruturas básicas do arcabouço civilístico geral como antessala especial, e ganham uma dimensão civil-constitucional, sobretudo, no que respeita às inegociáveis funções sociais do Direito.
Como dito acima, é um livro com caráter introdutório – e não um tratado. É livro, com limites editoriais, para iniciar uma jornada e preparar o leitor para as muitas estradas que se abrem, e para os muitos caminhos que se oferecem aos estudiosos das Ciências Jurídicas e Socias e áreas afins.
A minha satisfação e alegria consistem em colaborar com as sinalizações e orientações introdutórias para a formação jurídica contemporânea humanística, apontando especialmente para a alma de todo o Direito que é a humanidade, a pessoa humana, nacional ou migrante, na plenitude da sua dignidade, pessoa que não existe para o Direito, mas para quem o Direito existe, evolui e se humaniza.
Enfim, o que se espera nesta senda é avançar no sistema de Direito Civil e, muito além dos Institutos civilísticos, chegar aos fundamentos civilizatórios, como parece evidente se considerarmos a história jurídica brasil(eira), sobretudo, no campo do direito civil com as dificuldades em se tratar do tema por conta de usos e abusos de toda sorte ao longo do século XIX.
Foi muito difícil, após a Independência política do Brasil, chegar a um Código Civil (quase cem anos depois, em 1916) e, há 20 anos, às pressas, desengavetar e aprovar o antigo texto do presente CC/02.
Portanto, não deve (ou não deveria) ser difícil, atualmente, buscar e estabelecer parâmetros constitucionais, humanistas e civilizatórios para o Direito Civil, mantendo, contudo, sua dignidade histórica e sistêmica. É o caminho irresistível do devir e da perfectibilidade das relações humanas civilísticas, digo, civilizatórias.
Tishrei, 5784
Pietro Nardella-Dellova