Nos encontramos perdidos nos becos do tempo, nas encruzilhadas da história. E então somos confrontados com perguntas que nem a mais sábia das avós poderia responder. O genocídio em Ruanda, em 1994, esse espelho escuro da humanidade, nos faz refletir sobre a vida aqui, a vida agora. Não é uma comparação, é uma reflexão. É como olhar no fundo dos olhos de outra pessoa e ver a si mesmo. Ver o melhor e o pior de nós, lado a lado, separados apenas pelo fio de uma decisão, pelo traço de uma circunstância.

Mas não vamos amenizar o horror de tudo isso. Em Ruanda, vizinhos mataram vizinhos, crianças foram abatidas, mulheres foram submetidas a atos indescritíveis, e famílias inteiras foram dizimadas. Tudo num período de poucos meses. A crueldade foi além da imaginação, como um tapeçaria de pesadelo tecida com os fios mais escuros do impulso humano.

No entanto, a história, essa velha contadora de histórias, também fala de superação. Ruanda, aquele país que viu suas entranhas serem reviradas pelo ódio, encontrou força para se reinventar. Nos tribunais comunitários chamados Gacaca, na economia renascida, na inclusão de gêneros. Há esperança onde antes só existia escuridão.

Agora, um novo capítulo se desdobra diante de nós. Desde 7 de outubro de 2023, a alma de qualquer judeu israelense carrega um peso que não pode ser medido, não pode ser descrito. Mais de 1.400 judeus foram assassinados; crianças decapitadas; sobreviventes do Holocausto feitos reféns; famílias aniquiladas com uma sofisticação de crueldade que desafia a compreensão. Como, então, continuamos a viver? Como dividimos este pedaço de terra com os palestinos após tal atrocidade monumental?

Os humanos são criaturas paradoxais, capazes de amar tão intensamente quanto odeiam, de construir tão facilmente quanto destroem. Palavras de ódio têm diferentes nomes ao redor do mundo: “Itsembabwoko” em Ruanda, anti-semitismo aqui. Mas, por trás dessas palavras, o que temos? O mesmo impulso, o mesmo erro. O mesmo coração que bate, mas não sente.

Diante de tanto sofrimento, de tanta perda, a pergunta não é se devemos continuar a viver com os palestinos, mas como. Como transformamos esse solo encharcado de sangue em terreno fértil para o entendimento? Como fazemos a transição do luto à vida, da raiva ao diálogo, do ódio ao, talvez, amor? A resposta, meu amigo, não está escrita nas estrelas nem nas páginas de algum livro sagrado. Está em cada um de nós, em nossa capacidade de olhar para o abismo e dizer: “não, não desta vez”.

E aqui estamos, em meio ao caos, tentando encontrar um caminho, um sentido, uma resposta. A história nos mostra que é possível, mesmo quando tudo parece perdido. É nossa responsabilidade moral buscar essa possibilidade, por mais distante que pareça. E nessa busca, talvez encontremos não apenas a resposta, mas também a nós mesmos.