Afirmar que “a esquerda brasileira é antissemita” é uma generalização perigosa e não captura a complexidade e as diversas nuances ideológicas presentes nesse espectro político. A esquerda, como qualquer outro grupo ideológico, não é monolítica. Ela é composta por uma variedade de pensamentos e perspectivas, muitas das quais não têm qualquer relação com o antissemitismo.

Similarmente, a visão sobre o sionismo também varia dentro da esquerda brasileira. Algumas correntes podem ser críticas em relação às políticas do governo israelense, especialmente no contexto do conflito Israel-Palestina, mas isso não implica, necessariamente, uma postura antissemita ou anti-israelense em sua totalidade.

O perigo de tais generalizações é que elas reduzem debates complexos e multifacetados a simples rótulos, inibindo um diálogo produtivo e gerando estigmas indevidos. E assim como é errôneo resumir toda a esquerda brasileira como antissemita, é igualmente imprudente alegar que qualquer crítica ao sionismo seja fruto de antissemitismo. Ambas as questões são complexas e merecem uma análise mais cuidadosa e contextualizada.

Como parte integrante da comunidade judaica brasileira, sinto tanto orgulho quanto consternação ao observar o cenário político e social do meu país. Orgulho, porque a contribuição da nossa comunidade, embora represente menos de 1% da população total, é imensurável e ressoa através de várias esferas da vida brasileira. Consternação, porque vejo essa rica herança ser mal interpretada, e até difamada, por setores da sociedade que deveriam saber melhor.

Moysés Baumstein, por exemplo, foi uma figura proeminente na arte e na cultura, e seu trabalho continua a enriquecer nosso entendimento da identidade brasileira. Leão Veloso e Samuel Feldman foram vozes poderosas no ativismo político, ajudando a moldar a agenda da esquerda. Jacob Gorender e Fúlvio Abramo contribuíram significativamente para o pensamento marxista e a análise social no Brasil. E não podemos esquecer as contribuições em campos adjacentes, como as de Nise da Silveira na psiquiatria, Clarice Lispector na literatura e Lasar Segall nas artes visuais. Cada um desses nomes é um testemunho da profundidade e da complexidade da nossa comunidade, e do nosso investimento na construção de uma sociedade mais justa e equitativa.

É devastador, portanto, quando esse legado é ignorado ou distorcido por aqueles que escolhem defender o indefensável, seja o Hamas ou qualquer outro grupo que promova a violência e o ódio. Como alguém que fez Aliyah e escolheu Israel como lar, mas ainda carrega o Brasil no coração, fico perplexo com a facilidade com que alguns setores da esquerda brasileira abandonam princípios básicos de justiça e empatia, especialmente quando se trata do complexo cenário israelense-palestino.

Nesse momento de crescente polarização, volto-me para as palavras do rabino e escritor brasileiro Nilton Bonder: “Empatia é o contrário de indiferença, é o começo do fim do egocentrismo humano.” Este pensamento encapsula o que está em jogo: podemos escolher o caminho da empatia e do entendimento mútuo, ou podemos nos render à indiferença e ao preconceito. Como representante de uma comunidade que sempre se esforçou pela primeira opção, espero que o Brasil, como um todo, possa também fazer essa escolha.