Com uma diferença de apenas dois dias, vou estar votando em duas eleições. Dia 30 vou cravar Lula no segundo turno da eleição brasileira, e dia 1, Meretz na eleição israelense. É o que acontece com quem tem dupla cidadania e exerce seus direitos.
Ao contrário do Brasil onde Lula está praticamente eleito, em Israel assistimos um empate técnico entre a direita/extrema direita e o centro-esquerda. A quinta eleição em 4 anos aponta, pelo menos em tese, para uma sexta em 6 meses.
Pode-se fazer diversas leituras sobre o que está acontecendo. Eu vou procurar falar de algumas coisas, sobre as quais, poucos falam e se encontram nas entrelinhas.
Nestas eleições não existe um acordo entre os partidos religiosos e o Likud para uma “exclusividade” na participação de um futuro governo. Na eleição passada, estes partidos firmaram um acordo onde diziam que somente fariam parte de um governo tendo Netanyhau como primeiro ministro. Com isto ficaram de fora do governo e viram as tradicionais verbas que recebiam para as instituições religiosas minguarem.
Sem muitas opções com quem se coligar, já que Netanyhau afastou de si todos os demais partidos de direita, descumprindo promessas e rasgando acordos, restou uma nova força política que até agora vivia um certo ostracismo, a extrema direita Kahanista que se intitula sionista-religiosa. Ele ajudou a formação do partido que reúne dois expoentes desta linha radical. Eles propõem a Grande Israel com todos os territórios ocupados sendo incorporados e o incentivo aos árabes para que deixem o país, entre outras ações xenófobas e racistas.
O problema é que ele ignorou que uma parte dos seus votantes era parte deste grupo e viu os votos antes dados ao Likud migrarem para o novo partido. Com quase 15 cadeiras, segundo as últimas pesquisas, eles podem exigir o que quiserem para fazer parte de um governo de Netanyhau, no caso de uma vitória da direita. Do nada se tronaram o terceiro maior partido de Israel. O que existe de pior na sociedade israelense ali se encontra.
No grupo de partidos que são “rak ló Bibi” (tipo o nosso “Ele não”), também existem alguns problemas. O maior de todos é a indicação de uma baixa presença de votantes na comunidade árabe. Depois da Lista Conjunta ter se dissolvido, um dos partidos, Balad, o mais à esquerda deles, se encontra abaixo da cláusula de desempenho que aqui é de 3,25%, o equivalente a 4 mandatos. Nas contas finais, isto ajuda a direita.
O Meretz e o Avodá se encontram entre 4 e 6 cadeiras, dependendo de qual pesquisa se olhe. O número de cadeiras, para mais ou para menos, permanece entre os partidos que compõe o atual governo, ou seja, não migram para o lado de lá.
As pesquisas aqui tem um percentual de erro de 3,5%. No entanto ninguém manifesta o que esta margem significa, preferindo debater os números tais como se apresentam. Numa eleição tão apertada como esta, uma cadeira a mais para um lado é a diferença entre formação de governo ou novas eleições.
Na minha opinião estamos mais próximos de uma nova rodada do que da formação de governo. No entanto tudo fica em aberto até o momento em que as urnas falarem. Os indecisos podem pender para um lado só? Acho difícil, normalmente se distribuem uniformemente. Os árabes podem sair de casa para votar? Talvez, mas até o momento improvável.
De tudo isto uma última constatação. O partido do atual primeiro-ministro, dependendo da pesquisa, está com uma diferença entre 3 e 6 cadeiras para o Likud, tornando-se assim uma verdadeira força política. Yair Lapid sai fortalecido tanto para a formação de um governo, como para se tornar líder da oposição.
Esta é a minha leitura pessoal da atual situação, espero poder comemorar duas vezes. Uma com a vitória de Lula neste domingo, e outra, dia primeiro com a formação de um governo de centro-esquerda. Um mundo sem Bolsonaro e sem Netanihau é um sonho que pode se tornar realidade, um mundo melhor.