Há um tipo de antissionismo por parte de árabes e de palestinos que, no exato contexto político, econômico e histórico (do conflito entre Árabes e Israelenses), até se explica e se compreende. É admissível para o debate (ainda que eu considere esse termo inadequado e estúpido), ou seja, dá para ser objeto de diálogo ou debate. Nesse sentido dizer-se antissionista não pode ser compreendido como se fosse “antissemita”. É forçar demais e confundir conceitos.

Mas, quando essa bandeira do antissionismo é levantada por qualquer um sem qualquer consideração crítica, especialmente por aqueles de fora do conflito, tenho visto – e parece-me muito claro, tratar-se de antissemitismo (ódio e repulsa aos Judeus e ao Judaísmo).

Há grupos que, por osmose ou falta de conhecimento, defendem e abraçam o antissionismo, e, realmente, não disfarçam mais seu antissemitismo, incluindo a fala estereotipada contra Judeus. Por isso mesmo, muitos desses antissionistas atacam Judeus em qualquer parte do mundo em nome de um antissionismo tosco e osmótico.

É muito pouco dizer-se antissionista apenas para defender palestinos. É preciso dizer, e demonstrar, que tipo de antissionista se pretende ser, qual é o objeto da fala. Ser antissionista é colocar-se contra Israel e querer que ele seja esmagado ou “afogado no mar”? Isso, então, é antissemitismo, pois não existe uma entidade política israelense sem os princípios, valores e pressupostos judaicos históricos. O antissionismo que pretende a destruição de Israel é o mesmo antissemitismo que levou, no momento anterior à criação de Israel, aos extermínios e campos de concentração: essência e modus nazifascistas.

Entretanto, se o discurso do antissionismo se refere à expansão do Estado israelense, em especial, à ocupação da Cisjordânia, dá para conversar. Os Judeus de Israel (diga-se: nem todo israelense é judeu), sobretudo, os conscientes, também se colocam contra à expansão e ocupação daquelas terras, reconhecida pelo Direito Internacional como terras pertencentes aos palestinos, e fundamental para a base territorial do Estado Palestino. Nesse caso, seria menos que antissionismo, isto é, seria movimento contra a ocupação israelense da Cisjordânia.

Por outro lado, há vários que se dizem “sionistas” ou defensores do “sionismo” e, da mesma forma, quase não conseguem esconder seu ódio e desprezo por árabes e muçulmanos. Há cristãos, em especial, batistas, pentecostais, neopentecostais e, também, os chamados “judeus messiânicos” (cristãos de teologia batista com o rebolado neopentecostal e utilização indevida de símbolos judaicos e israelenses, entre os quais, Kipá, Mezuzá, Menorá, Tefilim Sefer Torá, Bandeira de Israel etc) que se dizem “sionistas” à luz dos seus perversos e descontextualizados versículos bíblicos. Consideram-se sionistas “em o nome de Jesus“, aglomeram-se em viagens turísticas ao Rio Jordão para o batismo hollywoodiano e facebookiano, e esperam o “retorno” do seu Messias crístico para reinar em Israel, esmagando muçulmanos e transformando em montanhas de cadáveres os não salvos em Cristo. São, na verdade, tipos perigosos anti-árabes e anti-islâmicos (ódio e repulsa pelos Árabes e Muçulmanos: islamofobia). Por isso mesmo, muitos desses sionistas atacam árabes e muçulmanos, por palavras (bíblicas, trumpistas ou bolsonaristas), ou atos de violência, em qualquer parte do mundo.

É esse tipo de sionismo que foi pensado, debatido e formado no final do século XIX, e que, de resto, alimenta toda alma judia desde o antigo Cativeiro babilônico, assim como do primeiro século desta era comum? Certamente que não!

Os valores do sionismo clássico, substancial, histórico, não têm a ver com ódio a qualquer grupo ou destruição de quaisquer sociedades. Muito pelo contrário, o sionismo histórico é ato de resistência e defesa do ideal judaico. Dito com outras palavras, o sionismo histórico é a ética da humanização e solidariedade humanas.

Há, portanto, sionismos em termos históricos e políticos que podem ser trazidos para a mesa do debate. É muito pouco ser sionista apenas para defender israelenses (pois defender israelenses é um termo abstrato, tendo em vista a diversidade e pluralidade da sociedade israelense). É preciso dizer, e demonstrar, respondendo às seguintes perguntas: qual o tipo de sionista se pretende ser? Histórico, substancial, filosófico, de alma para alma judias? Ou um sionista sem qualquer substância, isto é, um sionista osmótico?

Enfim, há um limite para a criticidade proativa e construtiva, há um limite para se defender ideias, propor ações, contestar teses, e até bater na mesa, e este limite chama-se, de um lado, Dialética e, de outro, Direito Internacional (em especial, Direito Internacional dos Direitos Humanos). Ficar de um lado ou de outro, sem qualquer ponderação, demonstra apenas os ódios represados, os rancores sonoros, o antissemitismo (ódio e repulsa aos Judeus e ao Judaísmo), o anti-islamismo ou anti-arabismo (ódio e repulsa a Muçulmanos e Árabes: islamofobia) e, desde logo, em um caso ou outro, a antessala do extermínio.

Da minha parte, sou Judeu, sou Sionista (buberiano e histórico), e sou de Esquerda libertária kibutziana. Defendo a existência política e jurídica de dois Estados para dois Povos: Israel e Palestina, e mantenho-me em luta diuturna contra o antissemitismo e suas afinidades eletivas, ou seja, contra a islamofobia, contra o racismo, contra a discriminação, contra o machismo, contra a misoginia, contra a intolerância religiosa, contra a xenofobia, contra o trumpismo, contra o bolsonarismo, contra o salvinismo e contra o regime norte-coreano e agregados (todas expressões atuais do mussolinismo, hitlerismo, stalinismo), contra a especulação neoliberal, contra a destruição de direitos dos Trabalhadores, enfim, contra o neofascismo.

publicado originalmente no Blog Café e Direito

Pietro Nardella-Dellova