Ao ser reconduzido ao cargo, em 23 de setembro, disse que não cabia ao Ministério Público atacar pessoalmente indivíduos, instituições, empresas ou mesmo a política, pois “é preciso diferenciar o combate à criminalidade na política e a criminalização dos atos políticos”. Como se o seu papel não fosse, pura e simplesmente, o de investigar e denunciar (ou não) os autores de atos ilegais e ilícitos. Coisa que ele não fará jamais, já que sua missão é de proteger Bolsonaro, família, governo e amigos.
Enquanto não resolve esse dilema, Aras deixa atrás de si uma esteira de impunidade de políticos, que no fundo deveriam ser tratados como são, ou seja como criminosos; a começar pelo seu chefe, o ocupante do Palácio da Alvorada.
Na segunda-feira, dia 4 de outubro, o procurador-geral da República foi surpreendentemente rápido (normalmente ele só age depois de tomar várias broncas dos ministros do STF) ao anunciar a abertura de uma apuração preliminar ao encontro do ministro Paulo Guedes e do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
A presteza de Aras, em princípio digna de aplausos, pode ser enganosa, já que « apuração preliminar » é uma expressão jurídica pomposa que prenuncia que o caso vai dar em pizza. Não é a primeira vez que, pressionado pelos fatos e pelos juízes da Corte Suprema, ele usa esta artimanha para «empurrar com a barriga », provavelmente até o arquivamento das investigações.
Como disse o próprio PGR, a apuração preliminar é aberta quando existe « lastro probatório mínimo em torno da prática de um crime ». Em outras palavras, se reconhece a existência de um ato muito próximo do crime, mas se quer dar tempo ao tempo ao invés de levar as investigações adiante. É uma espécie de pré-investigação que, talvez um dia, leve a uma investigação de verdade que, talvez um dia, desemboque ou não numa denúncia ao Supremo. Enquanto isso o tempo passa e nada acontece.
Dessa vez, Augusto Aras usa o argumento de que precisa ouvir Paulo Guedes antes de pedir a abertura de um inquérito, pois por enquanto tudo não passa de notícia de jornal. E, como se sabe, Aras não tem o menor apreço pelo trabalho jornalístico.
É evidente que o procurador-geral poderia abrir diretamente uma investigação, já que o artigo 5 do Código da Administração Federal proíbe funcionários do alto escalão de manter aplicações financeiras no Brasil ou no exterior, passíveis de serem afetadas por medidas governamentais. O conflito de interesse é portanto claríssimo, ainda mais que graças à politica econômica por ele implantada, Guedes ganhou muitos milhões com o aumento do dólar.
Desde 2019, a alta da moeda americana fez com que a sua conta valorizasse 18 milhões de reais.
Guedes é dono de uma empresa chamada Dreadnoughts, com sede no paraíso fiscal das Ilhas Virgens britânicas.
Vale a pena lembrar a famosa frase pronunciada por Guedes no primeiro ano de governo: “O dólar está alto? Problema nenhum, zero.” Ou aquela outra com a sua cara: “ Com dólar baixo até empregada doméstica ia à Disney.”
Enquanto isso, ele ficava mais rico…
Em 2014, Paulo Guedes Guedes abriu a conta da offshore numa agência do banco Crédit Suisse, em Nova York, depositando 9,55 milhões de dólares, o equivalente a 23 milhões de reais na época. Em 1° de janeiro de 2019, ele tinha 34,67 milhões de reais; hoje, mais de 52 milhões de reais.
O ministro defendeu o câmbio mais alto e foi contra a taxação dos depósitos de brasileiros fora do país. Foi ele quem retirou do projeto de reforma do Imposto de Renda o artigo que tributaria recursos em paraísos fiscais.
Isso prova, por A mais B, que além do conflito de interesse há também um conflito moral e ético, pois quanto mais o dólar sobe mais rico ele fica e mais pobres ficam os brasileiros. Seus advogados defendem que Guedes não atuou em causa própria, que jamais se beneficiou no âmbito privado de qualquer política econômica brasileira”. Honestamente, os números e os fatos são implacáveis; será impossível provar que ele não se auto-beneficiou.
No entanto, Augusto Aras preferiu o caminho tortuoso da apuração preliminar, talvez com o objetivo de ganhar tempo enquanto aguarda orientações de Bolsonaro, que tem agora uma oportunidade única de queimar definitivamente seu ministro . A decisão do Ministério Publico de abrir ou não uma investigação judicial que pode demorar anos. Ou ser arquivada rapidamente.
Quanto à Paulo Guedes e Roberto Campos Neto, como ministro e presidente do BC, tinham a obrigação ética, moral e legal de fechar suas contas nos paraísos fiscais e repatriar o dinheiro antes de aceitar os cargos. Na melhor das hipóteses não o fizeram por leviandade.