O remédio do tédio é mais que uma rima, e, se não é uma solução, pode abrir uma janela para conversar sobre esse sentimento. O tédio é um sentimento, e a vida pode ser tediosa seja por momentos ou muito mais tempo. Além do que, com a falta de encontros, a falta de abraços, a carência dos amigos, em um país onde os cientistas são chamados de canalhas, diminuem as luzes do Cruzeiro do Sul. Entretanto, há surpresas, e há anos aprendi uma das mais importantes lições sobre um dos remédios ao tédio. Era uma mulher que tinha a tendência de queixar-se de seu passado, queixas de que fora injustiçada, desprezada, e repetia as mesmas histórias. Tinha dias que me entediava, pois quando ela começava a falar eu já imaginava o script. Um dia (ainda bem que tem esses dias), recebi um e-mail dela sobre uma consulta em que falou quase sem respirar. “Tu não imaginas o quanto tu me ajudaste escutando, mesmo quando falo de situações que já passaram, pois me faz bem lembrar e saber que tenho força e sonhos com a graça de Deus. E com tua ajuda NÃO desabo, e quando envio pensamentos positivos estou dividindo contigo”. O “não” em maiúsculas foi dela mesmo, então fiquei surpreso e entendi que estava me pedindo para não desanimar. A paciência é um remédio ao tédio e a vida toda.
É frequente um analisando ser grato por ter alguém que o escute, ainda mais estando angustiado, carente de alguém. Recordo quando em 1972 em Buenos Aires esperava os minutos para ir até a calle Arenales, no “barrio Norte”, para deitar e falar à minha analista. Sou grato por ela ter aturado as minhas repetições e os choros de estar em um mundo tão diferente do velho Bom Fim. Uma das etapas da vida em que mais se fala em tédio é na adolescência, mas as crianças também falam em se sentir entediados, assim como os adultos e velhos.
Meu neto José, de cinco anos, ia passar um fim de semana fora de casa e pediu, muitas vezes, que fossem levados seus brinquedos. Perguntei por que precisava tanto deles se iria passear na natureza, e ele logo respondeu: “Se precisar ficar no quarto do hotel, quero ter com o que brincar, pois senão fico entediado”. Perguntei o que é se sentir entediado, e ele concluiu: “É não ter nada o que fazer”. O tédio é um sentimento que expressa angústia, sensação de desgosto, vazio, aborrecimento, tristeza.
O Rodrigo falava pouco, e, quando perguntado por qualquer coisa, respondia sempre: “Mais ou menos”. Passar com ele uma consulta inteira era sempre um desafio de paciência, de suportar o tédio dele e o meu. Um dia, perguntei-lhe com o que brincava na infância e me contou que tinha um carrinho que adorava e andava nele desviando dos pilares do edifício. Então observei como antes ele brincava tanto, inventava o dia a dia e tinha alegrias só com um carrinho, e agora estava sempre no mais ou menos. Vi seu espanto e ao mesmo tempo o meu, por ter levado tantos meses para sair do tédio semanal do mais ou menos. Não recordo quanto tempo passou para dizer que comprara a melhor caixa para bateria da cidade, pois ele era músico. Disse então: “Enfim saíste do mais ou menos”.
O tédio não ocorre só em alguém, pois há reuniões familiares tediosas, e uma partida de futebol pode ser chata. Também um país tem tempos autoritários, mentalidade negacionista (quase meio milhão de mortos), tempos entediantes. Incrível como aqui tem danças e músicas empolgantes, uma natureza de rara beleza (sendo queimada) e gente que só pensa em destruições e lucros. Já anunciaram os clarins a invasão dos armados amados pelo agropop e os donos do poder. Importante é não perder a poesia, não perder o humor, não perder a memória, que são alguns dos remédios para diminuir o tédio e elevar a dignidade.