AUTOANARQUIA
(para ser livre de mim mesmo)
I
Hoje
quero contradizer
O que disse ontem,
E amanhã, o que disser hoje:
Quero ser livre de mim mesmo!
Se eu vir que a fronte é feia,
Vou falar isso,
Mesmo que tiver dito ser belíssimo
O perfil de alguém…
II
E irei para o gozo sem freios
Ou para o adeus entre montes de terra.
Quero ir vivendo assim – livre –
Olhar por todos os ângulos
E jamais ser imbecil:
Escravo do orgulho de ter falado!
…assim, estarei realizado em cada vida
que eu viver em toda a vida…
III
Quero ser o mais instável dos homens
E não pensar que isso tem a ver
Com a personalidade
-que não muda, muda-
Mas, ser instável no pensamento
(causam-me horror a ideia fixa e os dogmas)
E no modo de olhar as coisas
Para que aperfeiçoe a mim mesmo
E descubra cores maravilhosas
(ocultas aos imbecis-estátuas)
IV
…não há limites para livros superarem livros e teses superarem teses, nem há limites para céus superarem céus e mares superarem mares, nem para mundos superarem mundos, nem para perspectivas superarem perspectivas e ângulos superarem ângulos, nem descobertas superarem descobertas:
V
há limites apenas para o ontem!
Quero concordar e discordar – livre –
Porque não temos que concordar
A vida inteira com o que concordamos
Um dia qualquer que passou, enfim!
…porque passamos pelo cinzel da existência…
VI
E vamos aprendendo novas “cousas”
Descobrimento novos matizes e faces:
É maravilhoso seguir rumo à perfeição
De não ser, jamais, perfeito em nada…
VII
Não quero soldar grades que me prendam
Mas, quero ir rumo a não-sei-o-quê.
Nunca quero dizer: cheguei!
E não quero chegar nunca em pensar: cheguei!
A vida perderia o sabor e amaria a morte:
Chegar é morrer!
VIII
Viver é superar a vida a cada instante!
Quero não gostar e amar depois,
Se eu sentir isso,
…e isso será vida, sim senhor,
acredite-me!
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© Pietro Nardella-Dellova
in NO PEITO. Editora L&S, 1990, pp. 58-59
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(ph.: my cabin in Appenzell)