O que pouca gente se dá conta é que nos idos do século 19 o sionismo foi a resposta judaica para a onda de nacionalismo que varria a Europa. Talvez tenha sido uma resposta saudável ao crescimento do sentimento antijudeu naquele momento, mas não há como negar, essa ideologia é prima tanto do nacionalismo Italiano quanto do Alemão, Frances, Sérvio e por aí vai. Se espelhando as narrativas dos seus de continente, ele se baseou num mito histórico para conceber uma narrativa um tanto ou quanto irrealista na qual os judeus seriam descendentes daqueles que foram expulsos da “terra santa” pelos Romanos há milhares de anos atras e por isso teriam não só o direito, mas o dever de retornar à terra de onde seu sangue brotava. Os outros nacionalismos eram iguais em suas exacerbações patrióticas, só que relacionavam sua linhagem histórica com a terra onde já viviam.

Se os nacionalismos europeus tinham vários furos étnicos e históricos, o sionismo certamente não foi uma exceção. Fora das lendas recontadas de geração em geração por judeus e não judeus, examinados de perto, os fatos não comprovavam a sua ligação com o então protetorado Britânico da Palestina. Para citar apenas dois exemplos; o Talmud de Jerusalém foi escrito in loco na época em que os judeus deveriam estar exilados na diáspora, expulsos pelos Romanos, o segundo era a complexão genética e mesmo as vestimentas dos judeus ultra ortodoxos que jamais teriam saído de um clima desértico, sem mencionar a diversidade genética do povo judeu. Existem inúmeros outros exemplos, mas não estamos aqui para discutir história.

Outro segredo mal guardado do sionismo é que, na sua origem, seus maiores patronos foram religiosos cristãos do império Britânico e dos Estados Unidos que acreditavam que para Jesus retornar, os Judeus deveriam voltar a terra santa e se converter ao Cristianismo. Um dos grandes expoentes dessa vertente foi Lord Balfour, autor da famosa declaração Balfour onde o Império Britânico se comprometeu a ceder um país aos Judeus na terra santa depois que partissem. Essa declaração teve mais peso na criação do estado de Israel do que qualquer ação de um sionista Judeu na época. Essa é a origem do famoso sionismo antissemita, pois esses patronos não viam judeus como parte integrante das suas sociedades e sim um povo externo a ser convertido. Ainda encontramos ecos desses patronos nos influentes movimentos evangélicos nos Estados Unidos e no Brasil, entre inúmeros eleitores do Bolsonaro apoiadores ferrenhos do sionismo.

Sem sombra de dúvidas, até a explosão de antissemitismo nos anos trinta, essa ideologia não era popular no mundo judaico. Para os religiosos um estado laico judeu não fazia sentido nenhum, só o messias poderia levar o seu povo de volta a terra prometida. Quanto ao resto, seus tons nacionalistas eram parecidos demais com o fascismo brotando em todo lado com o seu racismo agressivo e seu viés pró patronato.

 

Até então, a luta dos judeus tinha sido a de se integrar no mundo que os rodeava. Queriam sair dos guetos para serem alemães, poloneses, franceses, ingleses, russos, etc… e participar do mundo novo que se abria com a revolução industrial como seus vizinhos estavam fazendo. Só que o antissemitismo acabou falando mais alto, fechando-lhes as portas. Assim, o sionismo se tornou popular, principalmente com o antes, o depois, e o durante do Holocausto.

Mais tarde, quando o país Israel foi criado, ele teria o mesmo destino dos antepassados do enorme contingente de refugiados do nazismo que havia engrossado os assentamentos na “terra santa”. Desde o início, o mundo ocidental veria Israel como um favor prestado aos Judeus para compensá-los das tragédias que eles mesmos tinham incutido. O país teria o status de um inquilino vivendo de favor, destinado a servir e a se comportar dentro dos padrões requeridos pelo senhorio. Para os vizinhos Árabes, aquela população era – e ainda é – vista como forasteiros a serem expulsos das suas terras.

É aqui que essa crítica se encontra com a realidade do momento. Com as guerras e dos batismos de fogo que atravessou, Israel se tornou um Estado, ponto final. A evolução o transforou em algo maior que um Estado sionista. Minha defesa é pelo país e pelo seu direito e dever de se defender, como qualquer outro, de ameaças terroristas. Sou admirador e amigo desse país notável, mas não do sionismo, que para mim é o responsável pela sua situação precária, motivo principal da insalubre troca de assentamentos ilegais por apoio a um governo cada vez mais de extrema direita instalado há anos ali.

Como diriam críticos judeus no seu início; o sionismo é uma ideologia onde a religião é usada por não-religiosos para criar uma ficção nacionalista e, para alguns, justificar uma ocupação ilegal. Já o país Israel é uma realidade. Sim, foi criada a partir do mito nacionalista, mas não há nada de fictício naquele país pujante que conta com uma população de dois milhões de Palestinos vivendo com mais direitos, futuro e prosperidade do que seus irmãos em países vizinhos. Esse é um país que lutou e ainda luta para existir, como qualquer outro do planeta na sua história, com realizações tecnológicas surpreendentes, uma democracia rara na região e um dínamo econômico. Os Israelenses, obrigados a fazer serviço militar por três anos, são um povo resiliente, criativo e, em sua maioria, com uma cabeça e um coração aberto, embora vivendo num eterno e inconveniente estado de alerta militar. Talvez por isso, pouca gente fora de Israel entenda o Israelense, e o confunde com estereótipos culturais antigos de Judeus ou os veem no seu preconceito como sionistas genocidas e sedentos por sangue.

Mais do que nunca, é preciso separar Israel, sionismo e judaísmo, três coisas que, apesar de terem uma raiz comum, são muito diferentes. Sua ideologia oficial não ajuda em nada, nem ao país, nem à região, nem a nação judaica espalhada. É necessário renovar e se distanciar dessa maneira de pensar francamente ultrapassada para que todos na região floresçam, não só Judeus, como também Árabes e Cristãos. É necessário que todos os envolvidos no conflito se coloquem acima de heranças culturais e ajam como habitantes responsáveis pela região que têm em comum.

Finalizando, é claro que o(s) outro(s) lado(s) tem que colaborar e que Israel não pode baixar a guarda no quesito segurança, ninguém está sendo ingênuo aqui, mas alguém tem que dar o primeiro passo. Torço para Israel virar um Estado sem uma missão étnica ou cultural, sem um status especial, integrado no mundo, adaptado ao seu tempo, amigo dos seus vizinhos e um exemplo para o mundo. Chega de ser o eterno violinista no telhado do mundo.