As três perguntas talmúdicas de Hilel há dois mil anos seguem vigentes. O sábio dos sábios é visto por alguns teólogos cristãos como alguém que influenciou Jesus Cristo. Já escrevi sobre as duas primeiras perguntas: “Se eu não for por mim, quem será por mim?” e “Mas se eu for só por mim, o que será de mim?”, perguntas existenciais. Uma é o quanto cada um deve aprender a se amar, e a outra é o quanto devemos, como seres sociais, amar para não adoecer. Já a terceira pergunta, “E se não agora, quando?”, é uma pergunta inquietante. Muitas vezes não pode ser agora e não se sabe quando, como as perguntas que a gente faz de quem é ou de o quanto pode mudar. Ou se vão cessar comportamentos sofridos repetidos nos quais a gente se desvaloriza, se maltrata.
Já nessa encruzilhada que se vive aqui, talvez haja dois caminhos principais: um é apoiar o desprezo à Justiça, ao respeito, à dignidade, indiferença à fome, a saúde, a educação, a democracia. O outro é o da liberdade, do respeito aos Três Poderes, mesmo com críticas, a luta pela ecologia, a importância dos Direitos Humanos – como o antirracismo –, e conviver com o contraditório. Um dos maiores sintomas da doença crônica que assola a História do Brasil é a “genealogia da crueldade”, tanto individual como social. Genealogia deriva do grego: γενεαλογία, composto de γενεά- (genea-), origem, nascimento, e -λογία (-logia), estudo, conhecimento. Creio que a pergunta “E se não agora, quando?” envolve conhecer para agir, e aí está o X da questão.
“Que país é esse?” é uma pergunta que muitos têm escrito desde o século passado até hoje, como o recente: “O Soldado Antropofágico” – escravidão e não pensamento – no Brasil do psicanalista Tales Ab’Saber(lançamento em Porto Alegre dia 13/08). A História brasileira é uma história de crueldades assustadoras com os indígenas e negros em especial. Trezentos e cinquenta anos de escravidão fizeram do Brasil um país marcado por uma doença crônica de violências crescentes dos prepotentes do País. São muitos os episódios mortíferos: genocídio dos indígenas, a guerra dos Palmares, a de Canudos, a do Contestado, as ditaduras do país. Sem esquecer jamais o assassinato dos defensores das florestas até o cotidiano de assassinatos dos jovens negros. Aliás, José Bonifácio, o Patrono da Independência, defendeu em 1823 a extinção da escravidão, definindo-a como um “cancro social” e que o mal estava feito. É indispensável conhecer essa doença crônica que está há anos descompensada e pode piorar. Agora, uma festa em que o aniversariante é assassinado com gritos de guerra, e o estímulo do Poder Executivo à matança (quem mandou matar Marielle, Bruno, Dom e mais e mais?). O que preparam para antes das eleições é uma incógnita. Enfim, o País está sendo devastado, cortado, maltratado, vendido com mais de 30 milhões de brasileiros com fome.
Portanto, se não for agora a hora de ter uma prática democrata, quando será? Trabalhadores de todas as áreas profissionais começam a se manifestar, pois é hora de estar ao lado do povo. É fácil se declarar antirracista, antiautoritário, e dizer que no passado a gente seria contra o genocídio nazista, mas agora convém junto à vida privada incluir a vida pública. Todo voto anulado, todo voto em branco, todo desprezo pelas eleições serão votos que favorecerão os herdeiros da velha maldade da Casa Grande. Hoje, a terceira pergunta de Hilel, “E se não agora, quando?”, está dirigida a nós, pois é preciso expressar o amor ao querido Brasil no dia 2 de outubro. A hora é agora.