Aprendi que os canalhas serão sempre canalhas, e que os mexeriqueiros são sempre mexeriqueiros, e que os que estudam, estudam sempre, e que os mercenários da educação são sempre mercenários da educação.
Aprendi que o caráter de uma pessoa não depende do seu patrimônio, nem de sua raça e nem de sua crença…, porque onde estiver o cadáver ali mesmo se reunirão os abutres, herdeiros, causídicos, estelionatários e outros interessados.
Aprendi que o amar, a liberdade, a dignidade e a grandeza, nada valem diante de quem vive pelo dinheiro, fazendo contabilidade e olhando vitrines!!!
E aprendi, também, que maus alunos o são em qualquer escola, comum ou judaica, pública ou particular, estadunidense, brasiliana ou italiana!
Vejam, no final dos anos 90, eu comecei a apresentar meu trabalho, em uma das disciplinas do Mestrado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Faz muitos anos… O tema era sobre as meninas de rua do Rio de Janeiro do final do século XIX. Meu professor, então Ministro da Justiça, cochilava, cochilava de modo irresistível. (uma nota para esta edição do A Voz da Esquerda Judaica: este meu Professor assinaria, anos mais tarde, o Pedido de Impeachment contra Dilma Rousseff e ele era, que coisa!, o orientador da muito louca Janaina Paschoal, outra a rubricar o Impeachment, isto é, o golpe contra a Democracia). E eu insistia para que ele me ouvisse… mas, ele cochilava…
Chegamos a um lugar sombrio. É um estado de coisa, cujo jogo tornou-se absolutamente estranho. Faltam cartas na partida e o dadinho sempre dá no número seis! Os homens e as mulheres que formaram ninhos (ou rodeiam) no Congresso vivem do jogo, da jogatina. Parece não haver alguém que olhe sobre o espelho d’água a fim de não morrer de susto, de espanto e de terror. Vai ficando cada vez mais difícil identificar no meio da espessa fumaça “saída do esgoto social” que cobre o Congresso Nacional, quem é o parlamentar sério, comprometido e com alguma consciência nacional.
Mas, considerando os ângulos daquelas bacias lançadas nas terras de Brasília e aquele falo erguido, ao centro, como sinal de virilidade (mais prótese que virilidade), não há como não ver ali o reflexo de um povo que jaz na estultícia, no marasmo e na inércia. Afinal de contas, aqueles senhores e aquelas senhoras representam alguém que os elegeu para estarem lá. Representam alguém que se identifica com suas carreiras, seus nobres feitos, sua conduta irrepreensível. Representantes e representados formam uma unidade, indivisível e indissociável. Ali se aninham, não os congressistas de peso, não os parlamentares que atuam para melhorar o sistema jurídico do Brasil, ali estão, simplesmente, os jogadores, os churrasqueiros, os devastadores, os agiotas, os madeireiros, os garimpeiros, os exploradores, os especuladores, e tantos outros influentes participantes de uma sociedade extrativista, escravagista, e ícones de um povo que insiste em ser indolente.
O dinheiro público, vale dizer, o fruto de uma tributação impiedosa e agressiva, não encontra administradores e gestores capazes de cumprir o contrato político e social. Como pressuposto de qualquer contrato temos dois princípios norteadores: o da boa-fé e o da probidade. Deste, não há o senso íntegro, ético e justo na formação de um sem número de congressistas. Daquela, não há sinal, ao contrário, e, vale lembrar, como já dispunha o antigo Código Criminal do Império, permanece a má-fé que é o conhecimento do mal e a intenção de praticá-lo. Isto!
Má-fé e improbidade norteiam as ações, as omissões, os discursos, os desvios e as lamúrias dos parlamentares (melhor dizer, de quase todo parlamentar, seja federal, estadual ou municipal).
O
mundo vai desabar, acabar num monturo
de servidores comissionados e sem competência
e num volutabro de políticos,
e policiais inaptos e violentos, e juízes mórbidos de escrivaninha…
o mundo vai desfazer-se no esgoto
e no arroto, e no vômito, na descarga malcheirosa
e tornar-se um busilhão na numerosa imundície
dos tropeiros do governo
e na sua infecta intromissão.
o mundo vai acabar
nesses montes de vermes,
nessa disentérica sociedade,
o mundo vai acabar nesses montes
de merda, baratas, bigatos e coisas tais.
Ouvi do presidente do Senado, o senhor José Sarney, a declaração de que não sabia sobre os inúmeros diretores e funcionários, alguns fantasmas do Congresso. Esta declaração, por si só, atesta a má-fé de Sua Excelência. Sim, má-fé que é, também, desconhecer algo ou alguém que, no exercício de uma profissão ou atividade é pressuposto de ação! Fosse em outro lugar, o povo teria pedido a cabeça daquele imortal (sem mérito)!
Ouvi do presidente da Câmara dos Deputados os reclamos e lamúrias acerca da mídia e da falta de prestígio que vive aquela casa. Aliás, não apenas ela, mas todo o Congresso Nacional. Equivoca-se aquele Deputado. O Congresso Nacional, seja Senado ou Câmara dos Deputados, não está em jogo, apesar de forjarem o jogo, de desvirem cartas, de encravarem no dadinho apenas o número seis e de facilitarem, por ação ou omissão, por loucura ou estupidez, por apego ao dinheiro público e fácil, ou simplesmente por incompetência administrativa.
Os mercenários da república,
são falsos, são mentirosos, são desumanos,
são culpados da fome, e da peste,
e são culpados da ignorância,
e são culpados da morte!
mercenários da república, que falam, e discursam, e gastam!
–são protetores dos próprios interesses–
os mercenários da república, que assistem no conforto, e no luxo,
e na fartura, e no descanso, e no descaso,
a morte dos desgraçados e empesteados,
(por nada, por cada)
pela sua vontade pornográfica, por cada porco de gabinete!
os mercenários da república, são malignos mercenários!
são sujos mercenários!
são pervertidos mercenários!
–são mercenários–
Apesar da má-fé e da improbidade, a ideia de Congresso permanece. O conceito de Legislativo permanece. O princípio pelo qual o povo possa democraticamente ser representado em debates de alto nível mantém-se. E, finalmente, apesar destes Deputados e Senadores estarem ali, hoje, ainda é possível imaginar que o “Poder” do Estado possa ser dividido em três frentes independentes e harmônicas de ação clara e transparente: Legislativo, Executivo e Judiciário! É o que temos a preservar em face da Constituição Federal de 1988.
O resto, bem, o resto é o seguinte, de modo repetitivo, ipsis litteris: mantenhamos os canalhas à distância (e serão muitos), não nos associemos a estelionatários, agiotas e outras sanguessugas (e serão muitas), não defendamos cegamente ninguém na política brasil(eira), pois, comumente, as cadeiras da política são ocupadas por traseiros perversos (e são muitos!) que dispensam ao povo (melhor seria dizer massa!) apenas suas flatulências!
NOTA FINAL IMPORTANTE
O texto acima fora escrito antes de 2009, como Artigo para a Revista Z, da qual eu era Articulista, e, também, para o meu Blog Café e Direito. Posteriormente, foi publicado no meu livro A Morte do Poeta nos Penhascos e Outros Monólogos, de 2009. Republico, hoje, 2022, pois seu conteúdo está perfeitamente demonstrado no que veio depois: o golpe dado em 2016 contra o Mandato de Dilma Rousseff, o bolsonarismo que hoje tem bancada forte no Congresso, nas Assembleias e Câmaras Municipais, a bolsonarização das Instituições (Bolsonaro é “criatura” dos esgotos parlamentares), o arquivamento injustificado dos Pedidos de Impeachment contra Jair Bolsonaro (um deles, com minha participação), a militarização do Executivo, a neofascistização da sociedade, a neopentecostalização da política e das políticas públicas (saúde, educação, tecnologia, pesquisa, direitos humanos etc, setores ocupados por militares incompetentes, neopentecostais e olavistas) assim como a sergiomorização do Judiciário, incluindo o processo sem provas, a condenação sem pé nem cabeça e prisão ilegal do ex-Presidente Lula, tudo isso e coisas tais, que levaram o país a um estado de esgoto a céu aberto, à destruição da estrutura democrática e à morte de mais de 625 mil pessoas. As baratas estão aí, no Legislativo e, desse lugar, para o Executivo e respectivos Ministérios. O ano de 2022 deverá ser (ou deveria ser) de limpeza completa da bolsonarização e sergiomorização (faces do mesmo esgoto social, político e judiciário), a redescoberta dos valores democráticos, a defesa inegociável da Constituição Federal e a luta diuturna pelo processo civilizatório.
© Pietro Nardella-Dellova
(in A Morte do Poeta e Outros Monólogos. Ed. Scortecci, 2009, pp 286-290)