Já não há mais disfarce. Todo o processo que começou em junho de 2013, e foi conduzido com inegável e invejável maestria pelo que há de mais sórdido na elite brasileira, chega ao desfecho por ela desejado.

Digam o que disserem, vivemos sob nova ditadura militar, a serviço – como de costume – dos interesses imperialistas dos Estados Unidos da América do Norte e da consolidação dos privilégios dos ricos (seus eternos lacaios), e sacrifício dos pobres.

É exatamente a mesma roupagem de 1964, adaptada apenas aos novos ditames da moda. Não foi preciso deslocar uma frota ao nosso litoral, ou movimentar tropas, ou depor um presidente pela força.

Bastou utilizar com habilidade os novos instrumentos tecnológicos da guerra híbrida. Quem tem porventura ainda alguma dúvida, dê uma olhada aqui: http://www.brasilwire.com/how-the-united-states-killed-brazils-democracy-again/ – é longo e está em inglês, mas é importante para quem quer entender o que está acontecendo.

Seja como for, o fato é que sem dúvida voltamos a 1964. Ainda não começou a repressão violenta, até mesmo porque desnecessária, já que até aqui não houve nenhuma resistência. Mas ontem (22/05) já ficou bem claro o que virá se alguém ousar desafiar o onipresente  e incontrastável poder militar.

O milico mais próximo do presidente ameaçou a nação, com todas as letras, de retirar a fina e transparente capa que nada esconde, e escancarar o arbítrio que já vigora. Alguém disse que se trata de um arroubo isolado de quem não tem apoio pra soltar a besta.

Bobagem. O cara só parece um asno. Não faria algo dessa natureza sem aprovação do chefe e respaldo dos colegas.

Subestimar esses canalhas é – sempre foi! – o melhor caminho para o inferno. Miremo-nos, por favor, em 1964 – que, insisto, voltou!

As forças armadas brasileiras foram incapazes de produzir um único democrata depois daquele golpe. E já lá se vai mais de meio século! A culpa é também nossa, os que lutaram e lutam pela liberdade, que jamais tivemos condições de nos mobilizar para arrancar um acerto de contas com a História da ditadura.

A culpa é também nossa porque, ao longo de quase catorze anos no poder, não fomos capazes de tocar nas estruturas injustas que regem nossa sociedade essencialmente escravocrata. Que compusemos com a elite mais nojenta da face da terra. E que cedemos a tentações não republicanas, violando normas das quais éramos os mais notórios guardiões, e com isso entregando, de bandeja, o pretexto ao inimigo.

O paradoxo irônico por excelência é que o golpe mais contundente até aqui assestado contra a corja milico-miliciana que assaltou o poder através de artimanhas extremamente abjetas, veio de dentro, desfechado justamente pelo mais pérfido, sórdido e perigoso de seus integrantes, autor das piores delas.

Fazendo jus à sua natureza artrópode aracnídea, o ex-juiz e agora ex-ministro Sérgio Moro aproveitou a posição privilegiada que alcançou à custa de sua falta de escrúpulos elementares, para se armar e, chegado o momento, fez o que de melhor (e único!)  sabe fazer: adotou a postura que mais favorece seus interesses e projeto pessoal, doa a quem doer.

Como não é capaz de ter amigos, salvo a si próprio, traiu serenamente seus novos “aliados”.

Assim, com a pior das intenções, terminou por entregar à sociedade brasileira, juntamente com as vísceras do regime podre que criou e ao qual serviu enquanto dele se podia servir, informações preciosas com as quais as instituições, se funcionassem, poderiam esboçar uma defesa para o país.

Não nos iludamos porém. Repito: as intenções do verme são as piores possíveis. Ao instalar a cizânia no interior das hostes fascistas, longe do bem do país, só o que pretendeu foi desequilibrar a respectiva correlação de forças para seu próprio lado.

Pode, entretanto, ter subestimado a fera. Acuadas, elas só sabem reagir com redobrada ferocidade.

Os primeiros sinais disso já estão claríssimos a quem tem olhos de ver.

A julgar pela história se repetindo como farsa, tudo indica que o tiro de Moro pode estar se dirigindo inexoravelmente à culatra. Seu destino poderá ser o mesmo reservado a Carlos Lacerda nos idos de 1964. Os corvos que criou lhe devoraram os olhos.

ro de Moro pode estar se dirigindo inexoravelmente à culatra. Seu destino poderá ser o mesmo reservado a Carlos Lacerda nos idos de 1964. Os corvos que criou lhe devoraram os olhos.