Com a previsão de frio para minha cidade se confirmando, o céu cinza indicando que a chuva não tardaria, recebi a notícia de que Sharon tinha aceitado o plano do Mapa da Paz. Ainda sob o choque da informação e com as primeiras gotas de chuva caindo, pensei que estava sendo enganado por alguns dos meus sentidos. Será que era um sonho? Teria lido corretamente aquelas linhas?
Um dia antes, o mesmo Sharon dizia que tinha sérias restrições ao plano e que para aceitá-lo seriam necessárias várias alterações. Enquanto repetia que era preciso antes de tudo acabar com o terror e que as colônias permaneceriam onde estavam, desperdiçava um encontro com o primeiro ministro Abu Mazen e me fazia crer que continuaria a ser o mesmo intransigente de sempre. O que teria acontecido?
Com esta dúvida em mente, e conhecendo Sharon, sabia que não era possível confiar nele. Muita gente sabe que Arafat tem um discurso pronto em Inglês e outro em Árabe. Quer dizer, fala uma coisa para o mundo e outra para seu povo. Sharon se parece muito com ele. Num dia diz uma coisa e no dia seguinte outra. É bom de promessa (Paz e Segurança), mas é incapaz de cumpri-las, ou pensa que as cumpre, a sua maneira e as nossas custas.
O fato relevante no entanto, e o que merece destaque, é que finalmente um plano de paz é aceito pelos dois lados. Sim é verdade que já tivemos outros acordos que ambos trataram de não cumprir, no entanto pela primeira vez um plano apresentado por um conjunto de países sem a interferência dos beligerantes, acaba sendo aceito por eles. Ainda não se pode dizer que terá sucesso mas finalmente foi possível acender a luz no fim do túnel.
Palestinos e Israelenses terão de cumprir com tarefas muito difíceis. Acabar com o terror e retirar as colônias serão tarefas hercúleas em seu grau de dificuldade e imprescindíveis para o avanço do plano. Os patrocinadores sabem disso e devem ser firmes ao não permitir que a execução de uma esteja condicionada ao cumprimento da outra. Os dois lados devem tratar de cumprir com estas tarefas de forma simultânea.
Não arriscaria dizer quem tem a tarefa mais difícil. Os dois lados vão precisar integrar suas forças de segurança e retomar os contatos de inteligência para que possam ajudar no seu cumprimento. Esta fase vai exigir muita paciência e compreensão da realidade. O terror não vai acabar totalmente. Ele já é um fenômeno internacional e mesmo com a paz será difícil erradicá-lo totalmente. Por isso terá que valer o esforço das partes no cumprimento das tarefas, mais do que talvez, no seu resultado. A retirada dos colonos vai trazer a tona toda à contradição existente entre o papel delas na segurança de Israel e o desejo da construção da Grande Israel.
Se o terrorismo não vai ter fim tão cedo, o mesmo não pode dizer do terrorismo de Estado. Este sim pode e deve ter fim o quanto antes. Afinal ele é um dos elementos que ajuda na formação de militantes para os grupos terroristas e com o fim das operações de assassinatos seletivos que tantas vítimas civis tem feito, retira-se um dos fatores geradores na formação deles.
Tudo isto ainda é muito incipiente. Muita coisa pode acontecer para bem ou para o mal. O ponto de partida nos dá esperança. A aceitação do plano era a pedra fundamental na construção do entendimento que pode levar ao acordo de paz definitivo com a criação do Estado Palestino. Não vão faltar inimigos da paz para tentar solapar todos os esforços do entendimento. De que lado Sharon vai estar?
Nunca é tarde para se redimir. Por isso eu quero acreditar que nosso primeiro ministro vai se colocar ao lado da paz. Quero acreditar que vai ser capaz de desmantelar as colônias e trazer nossa gente de volta para as fronteiras de 1967. Tenho fé de que ele vai conseguir tornar nossa Jerusalém a capital de dois Estados compartilhando seu passado e seu futuro como exemplo de convivência pacífica entre os povos.
Desta vez espero sinceramente que Sharon assuma e cumpra sua promessa de campanha: paz e segurança. Que com a aceitação do Mapa da Paz, esta tenha sido sua última e definitiva metamorfose como Camaleão. Que este sonho se torne realidade e o futuro de prosperidade de israelenses e palestinos comece a ser construído aqui e agora.